segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A vida e as mulheres de Zacarias

Acho que sou um cara meio sortudo. A notícia ruim é que, sendo meio sortudo, sou também meio azarado. Sou fruto da ultima gota de esperma de um cliente da minha mãe, que morreu em cima dela no meio da gozada. Nunca soubemos o seu nome, nem minha mãe recebeu pelo programa. Afinal, não dava para cobrar da viúva. Quando soube dessa história, contada pela minha mãe, aos doze anos, passei a desejá-la. Devia ser muito gostosa na cama a ponto de matar o cara de tanto gozar. No início da gravidez, minha mãe tentou se livrar do bastardinho usando dezoito comprimidos abortivos (tomou nove e introduziu outros nove na boceta) e mesmo assim eu nasci perfeito, na medida do possível.

Tive uma infância como qualquer filho de puta. Passava os dias com a minha mãe e as noites, quando ela saia para trabalhar, com alguma puta aposentada amiga dela. Devo dizer que nunca passei fome, tive o estritamente necessário para um ser vivente não morrer. Aos seis anos fui para a escola. Foi uma fase chata. A professora de matemática não conseguiu me explicar a finalidade daquele monte de números somados aquelas letras que era igual a um número e uma letra juntos. A professora de português não conseguia me convencer que falar corretamente me abriria portas (eu achava que uma arma na mão era mais eficaz que a gramática). A professora de história nunca me falou para que servia saber o que aconteceu há séculos com pessoas que eu nunca vi. Aos doze anos, abandonei a escola.

Depois que abandonei a escola passei a trabalhar na rua. Pequenos serviços... Uns legais, outros nem tanto. Foi nessa época que soube pela minha mãe como fui feito. Fazia questão de chegar em casa antes dela sair para espioná-la se aprontando para a noite. Bati muitas punhetas vendo-a pela porta entreaberta do quarto ou pelo buraco da fechadura. Tenho certeza que ela sabia do meu desejo, mas nunca reprimiu. Na época, eu não sabia exatamente em que ela trabalhava à noite. Se soubesse teríamos tido problemas, eu era muito ciumento. Quando tinha dezesseis anos fui preso subtraindo dos outros o que não era meu. Na delegacia, por sorte, pois os policiais estavam ocupados com criminosos mais perigosos do que com um pivete batedor de carteiras, não me bateram muito, apenas uns safanões. Tive mais sorte ainda por que fui mandado para a “classe alta”, celas onde ficavam os delinqüentes menos perigosos. Os relatos que vinham da “classe baixa”, onde ficavam os delinqüentes mais perigosos, eram aterradores.

Foi lá que conheci o pastor Edevaldo, um homem generoso, que ia com freqüência na carceragem buscar membros para o seu rebanho. Quando saí de lá, resolvi ir até a igreja do pastor. Conheci Karine, uma obreira devota e magricela, por quem me senti levemente atraído. Nessas alturas, a relação com a minha mãe andava estremecida. Ela não foi me ver na delegacia nenhuma vez. Mas meu desejo por ela continuou intacto. Apenas era reprimido pela minha fé que eu achava que tinha. Arranjei um emprego de faz tudo numa loja de tecidos. Quando completei dezoito anos tornei-me vendedor. Nada mais monótono do que vender tecidos para velhas matronas pouco interessantes.

Nunca levei Karine à minha casa, não havia compatibilidade entre a atividade profissional da minha mãe e a igreja. Nunca tentei convencer a minha mãe a deixar o seu trabalho, por mais que deixasse transparecer que o condenava, mas na verdade me excitava. Imaginar a minha mãe com outros homens aumentava o meu desejo por ela. As punhetas nunca cessaram. Procurava levar uma vida certinha, pelo menos na aparência: Culto, lanchinho depois do culto de mãos dadas com a Karine, sempre de terno e gravata e alardeando mecanicamente o “a paz do senhor, irmão”. Nas horas vagas, que eram poucas, ia à puteiros e sempre pensava na minha mãe enquanto comia uma puta pagando-lhe uns trocados. Toda puta era a aminha mãe.

Meu esforço de devoção durou quatro anos. Aos vinte resolvi sair da igreja e acabar o namoro com Karine, que já contava com casamento certo. Nesse momento acalentava apenas um sonho: comer a minha mãe. Não sabia como fazer isso. Estava pensando exatamente nisso quando senti um forte impacto nas pernas que me jogou para o alto e para frente ao mesmo tempo. Tinha atravessado a rua sem olhar, com certeza. Antes de ser jogado, vi através do para brisa um rosto. Ela era um pouco mais velha do que eu. Mesmo assustada, era linda. Senti o forte impacto do meu corpo no asfalto. Percebi meu coração vacilar, meus pulmões se esforçavam para puxar o ar que teimava em não vir. Ela estava agora ao meu lado. Chorava. Ela me livraria da minha mãe. Já não sentia mais dor. Era tarde.

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