quarta-feira, 27 de abril de 2016

A tumba e outras histórias – H. P. Lovecraft

Mestre do gênero Terror misturado com elementos fantásticos típicos de gêneros como Fantasia e Ficção Científica, para Howard Phillips Lovecraft a vida é incompreensível ao ser humano e o universo é infinitamente hostil aos interesses do homem. Em A tumba e outras histórias, o autor reúne 13 contos divididos em três partes, sendo a primeira com contos da sua fase adulta; a segunda com os seus primeiros escritos, ainda na adolescência; e a terceira parte traz fragmentos de textos que deveriam, no futuro, se transformar em novas histórias, o que terminou não acontecendo.
O livro começa com o conto que dá título ao livro, A tumba. Nele, o jovem abastado Jervas Dudley conta como desenvolveu uma obsessão pela tumba de uma família no terreno ao ledo da sua casa. Em O festival, o personagem se vê participando de um festival macabro numa cidade fantasma. Ao final, o leitor não sabe se ele realmente viveu aquilo ou tudo foi fruto da sua imaginação.  No terceiro e mais longo conto do livro, Lovecraft usa um personagem real, o ilusionista Holdini, para dá uma aula de história e geografia egípcias e, claro, usa muito do macabro e do sobrenatural para contar sua história. Os contos Ele, Horror em Red Hook, A estranha casa que pairava na névoa, Entre as paredes de Eryx e o Clérigo diabólico vão de fracos a medianos.
Na segunda parte, onde constam os escritos de adolescência de Lovecraft, destaca-se o conto A fera na caverna, que conta a história de um sujeito que se perde do seu grupo durante uma visita a uma caverna. Munido apenas de uma tocha prestes a apagar, ele se afunda cada vez mais na caverna, pressentindo a presença de uma fera misteriosa. Após feri-la e reencontrar o guia, ele terá uma surpresa. Outro conto muito bom dessa parte do livro é O alquimista, que conta a história de uma maldição que atravessa gerações da família do conde Antonie, que terá que estudar feitiçaria e demonologia para escapar do destino que o aguarda.     

domingo, 24 de abril de 2016

Cris, a fera & outras mulheres de arrepiar – David Coimbra

“sexo com uma prostituta é quase uma masturbação assistida”.
Em Cris, a fera & outras mulheres de arrepiar, publicado em 2008, David Coimbra faz uso do tema que mais lhe agrada: as mulheres. São sete contos onde elas são protagonistas e, mesmo quando não o são, influencia na vida do protagonista. Percebe-se em alguns contos o fantasma de Nelson Rodrigues rondando a escrivaninha do jornalista gaúcho, soprando-lhe nos ouvidos “historinhas” picantes e personalidades femininas típicas das narrativas do “Anjo pornográfico”, como em A devoradora de homens e A mulher que trai.
“Os homens só pensam em sexo, mas, mesmo só pensando em sexo, não são capazes de patrocinar bom sexo para uma mulher que seja minimamente exigente”.
E esses dois contos, os últimos, valem a pena por todo o livro. Em A devoradora de homens, Milena, que sofria de “Furor uterino”, tinha um apetite sexual insaciável e era, para muitos, “a mulher mais perigosa do Atlântico Norte”. Os homens que faziam sexo com ela ficavam apaixonados (e extenuados), sendo esnobados pela bela morena. Até entrar em cena Potter, um homem que “sabia o que dizer a uma mulher”. O fantasma de Nelson Rodrigues aparece já no título de A mulher que trai. Dani, depois que descobriu as traições de Dorval, resolve trair o marido somente uma vez.
“Ex-mulheres não deviam ficar gostosas. A ex-mulher ideal é a que se transforma numa gorda escroncha, um bagulho pálido, desbotado, disforme e sem vida para o qual o homem olha e sorri e diz para si mesmo, num suspiro de satisfação: ‘Rapazzzz, fiz a coisa certa!’”.
O primeiro conto, Bandeira 2, conta a história do taxista Fred, que encontra um corpo no porta-malas do seu carro após um encontro casual regado a muito sexo com uma morena estonteante. Em Horror na cidade grande, David Coimbra, usando uma linguagem de comédias de cinema, conta as trapalhadas de Régis na cidade grande. Em Cris, a fera, a personagem-título se transforma numa serial killer após ser abusada sexualmente e matar o agressor.
“A mulher perfeita é aquela que transa de todas as formas com a gente até as duas da madrugada e depois se transforma numa pizza com Coca-Cola”.
Em Tentação, Rudi, após desconfiar que estava sendo traído pela mulher com seu próprio chefe, resolve roubar o dinheiro da firma, proveniente de corrupção. Na fuga para o Uruguai, encontra Renata, uma colega de escola, no aeroporto. Esse encontro irá mudar a vida de Rudi, mas não muito. E em A ninfeta, Airton, um advogado quarentão e casado, fica deslumbrado com Suzi, uma adolescente de dezesseis anos. Após muitos dramas de consciência, Airton tenta se envolver com a jovem e se mete em confusão.  

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Pistoleiros também mandam flores – David Coimbra

“Talvez até tivesse sido bom abreviar a passagem dele por esse vale de lágrimas. Convenceu-se de que foi um ato humanitário ceifar o sofrimento do pobre coitado. Dez segundos, tudo resolvido. Sem aquela longa agonia dos hospitais, sem a decadência da velhice. Muito mais prático e barato. Deviam lhe agradecer”. 
Ambientado em Porto Alegre, Pistoleiros também mandam flores, publicado em 2007, é uma bem-humorada novela policial que tem como protagonistas o pistoleiro Aníbal, um ex-policial que resolveu entrar para o “ramo de eliminações de problemas por encomenda”; e o jornalista em início de carreira recém-chegado do interior Régis Rondelli, um sonhador incorrigível. Em torno de ambos o também jornalista Nico, um bom vivant que tem a sorte sempre do seu lado quando o assunto é mulher.
“Assim era bom, assim era direito: executar a vítima antes mesmo que ela pudesse sentir medo ou dor. Isso era clemência. Isso era humanidade. Isso era civilização. Aníbal era uma boa pessoa”.
A história começa com o assassinato do professor Vanderlei. Não é segredo para ninguém que o autor foi Aníbal, que além de pistoleiro, tem também uma veia “filosófica”. O mistério está em quem mandou matar e o motivo. É aí que entra em cena o projeto de jornalista Régis Rondelli. Sonhando com um carrão na garagem, belas mulheres, uma conta bancária recheada e viagens a paraísos terrestres, Rondelli ver na investigação do crime e seu desvendamento a ponte para realizar todos os seus sonhos.
“Quando a mulher se torna esposa, ela se torna parente. A relação sai do âmbito do prazer e vira obrigação. (...) O sexo deixa de ser sexo. Toda aquela intimidade causada pela monogamia se transforma em amizade, em afeto, em carinho ou, pior, em amor”.
Quem ler Pistoleiros também mandam flores se sente confidente dos personagens. O Aníbal tentando convencer a todos da “nobreza” da sua profissão; Rondelli partilhando com todos os seus sonhos de grandeza; e Nico distribuindo charme e filosofia anti-matrimônio. E essa sensação é causada pela escrita de David Coimbra: envolvente e agradável, parecendo até que o autor está batendo um papo com o leitor.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Canibais – Paixão e morte na Rua do Arvoredo – David Coimbra

“Perfumava-se com abundância, o monstro. Está certo, a população inteira de Porto Alegre, com exceção dos escravos, tinha o hábito de se perfumar, numa artimanha para sufocar a pestilência natural da cidade e mau cheiro dos próprios habitantes, poucos afeitos a tomar banhos”.  
Tenho percebido pelas minhas últimas leituras que o Rio Grande do Sul é um celeiro de grandes escritores. E não estou falando de Érico e Luís Fernando Veríssimo, Moacyr Scliar ou Josué Guimarães, escritores já consagrados. Estou falando de Cláudia Tajes, Letícia Wierzchowski, Cíntia Moscovich, Tabajara Ruas, autores que ainda não caíram nas graças do grande público, mas que têm um talento grandioso.  O mais recente desses talentos dos pampas a que tive contato através da leitura foi David Coimbra.
A primeira vez em que tive contato com a obra do Jornalista, radialista, escritor e cronista do jornal Zero Hora foi em 2014, com Mulheres!, um livro de crônicas e contos, postado nesse blog em abril daquele ano. Confesso que não me empolguei muito. Esse ano, li Canibais – Paixão e morte na Rua do Arvoredo, romance de 2004, e fiquei fascinado. Conduzindo a narrativa com muita habilidade a ponto do leitor ter dificuldades para interromper a leitura, David Coimbra faz uma reconstituição histórica perfeita da época.
Ambientado na Porto Alegre do século XIX, o romance nos conta a história real do açougueiro José Ramos, estabelecido na Rua do Arvoredo, e da sua bela esposa Catarina Palse, uma loira estonteante de origem húngara. Aproveitando-se da sua beleza, Catarina atraia homens para sua casa, seduzia-os, e eram mortos por Ramos. Transformada em linguiça, a carne das vítimas eram apreciadas por toda a sociedade Porto-alegrense. Como virou tabu na época, esse assunto é tratado hoje um pouco como história real e um pouco como lenda urbana. Independente disso é uma obra primorosa.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

As ligações perigosas – Choderlos de Laclos

Choderlos de Laclos, oficial do exército francês, escreveu apenas um livro, o romance epistolar As ligações perigosas, em 1782, causando grande escândalo na nobreza francesa da época. O visconde de Valmont e a marquesa de Merteuil são dois libertinos que passam a vida tentando atrair outras pessoas para as suas vidas dissolutas. Na história narrada por Laclos, traçam planos que, inevitavelmente vão se cruzar. O visconde tentará seduzir a presidente de Tourvel, uma mulher bem casada, fiel ao marido e aos princípios cristãos. Convenientemente, a presidente está passando uma temporada na casa da tia do visconde, o que lhe dará a oportunidade de, através de cartas, seduzi-la e jogar por terra seus princípios puritanos. 
Já marquesa tentará envolver a jovem Cécile de Volanges, uma jovem que foi retirada do convento para casar com um homem bem mais velho por vontade de sua mãe, numa trama em que trairá seu futuro marido. Cécile é apaixonada pelo seu jovem professor de arpa, Danceney, mas aceitará o arranjo da mãe, a conselho da marquesa. No entanto, com a ajuda da dissoluta dama, tentará ficar com o seu amor juvenil, traindo a vontade da sua mãe e seu futuro marido.
Na época do seu lançamento, a obra chocou a alta nobreza pela sua imoralidade e pela crueldade dos personagens, o que rendeu um processo para a o autor. Em 1823, o Tribunal Correcional do Sena mandou destruir “esse escrito perigoso que ultraja os bons costumes”. Em 1988, o livro foi adaptado para o cinema, com Glen Close, John Malkovich e Michele Pfeiffer. No início de 2016, virou uma minissérie da Rede Globo.