quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Aura – Carlos Fuentes

Em Aura, pequena novela do escritor mexicano Carlos Fuentes, publicada pela primeira vez em 1962, o jovem professor de história Felipe Monteiro lê nos classificados do jornal um anúncio de emprego tentador: uma vaga de secretário com boa remuneração, cama e comida. De tão bom, Felipe ignora-o na primeira vez em que ler. Quando, dias depois, volta a ler o anúncio, resolve se candidatar ao emprego.
“Você lê esse anúncio: uma oferta assim não é feita todos os dias. Lê e relê o anúncio. Parece dirigido diretamente a você, a ninguém mais.”   
Num casarão antigo, completamente às escuras, perdido no meio da modernidade urbana, Felipe conhece a senhora Consuelo, a decrépita viúva do general Llorente, uma senhora que parece ter bem mais idade do que um ser humano é capaz de viver. A tarefa pela qual será muito bem remunerado consiste em organizar os manuscritos memorialísticos do falecido general. Para isso, uma exigência da contratante: Felipe teria que morar na casa até terminar a tarefa.   
É nesse ambiente lúgubre que Felipe conhece a bela e misteriosa Aura, que o serve enquanto está hospedado na velha casa. Entre fatos estranhos que acontecem na casa, como gatos que num dia miam em outro agonizam, mas que a velha Consuelo insiste em negar-lhes a existência, o jovem professor se apaixona por esse anjo-demônio, velha-jovem, pessoa-fantasma que é Aura. Um livro para se ler de uma sentada.

domingo, 27 de setembro de 2015

O jogo de Ripper – Isabel Allende

Isabel Allende é uma escritora prolífica, com 23 livros publicados, fora as peças de teatro. Acho-a uma escritora fantástica e vários dos seus livros estão entre os melhores que já li na vida, como A casa dos espíritos (1982), Retrato em sépia (2000) e A filha da fortuna (1999). Sem contar Paula (1995), um relato comovente da doença e posterior morte da filha da escritora. O jogo de Ripper é o seu 23º livro, publicado em 2012, e sua primeira experiência no gênero policial.
Amanda Martin é filha do inspetor-chefe do Departamento de Homicídios de São Francisco, Bob Martin, e de Indiana Jackson, uma criatura meio “riponga” que trabalha numa clínica holística. A garota de 16 anos se diverte desvendando crimes de mentira com seus amigos virtuais espalhados pelo mundo via Skype (esse é o jogo de Ripper). Até que crimes de verdade começam a acontecer na cidade e a turma, abastecida com informações privilegiadas dadas pelo pai de Amanda, começa a investiga-los. 
Não sei se criei uma expectativa exagerada por se tratar de um livro de Isabel Allende, uma das minhas escritoras preferidas, mas confesso que o livro não correspondeu às essas “exageradas” expectativas. Por se tratar de um Thriller (assim foi anunciado) esperava uma narrativa mais dinâmica, o que não acontece. Nas primeiras 150 páginas a história se arrasta com a exposição de muitos detalhes dos personagens, que é uma característica da escritora. Mas o livro não é ruim! Inclusive atende uma das “exigências” dos Thrillers: é quase impossível saber quem é o verdadeiro assassino até que ele seja anunciado no final da trama.
Mas Isabel Allende tem créditos de sobra e vale a pena conhecer mais uma das suas obras. Mesmo que não seja a melhor delas.


quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Insensata gratidão

Recentemente fui “convidado” para participar de um seminário da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Entre as discussões estava a utilização de novas tecnologias no ensino noturno. Nunca vi tanto tempo e dinheiro perdidos em tão pouco tempo! Como discutir a utilização de novas tecnologias se não há internet? É o mesmo que discutir estilos arquitetônicos inovadores sem saber fazer um alicerce. E por que não temos internet nas escolas?
A resposta está na pesquisa divulgada nessa segunda-feira (21) pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.Br) que aponta que 59% dos alunos das escolas públicas brasileiras não usam internet no ambiente escolar. Pode até parecer uma contradição com o censo/2014 que aponta um salto no acesso das nossas escolas a internet de 47% em 2010 para 61% em 2014. Mas não é! A escola tem internet, mas o aluno não tem acesso a ela.
E não tem acesso a internet nas escolas por que ela é ruim, lenta. Enquanto em países sérios e minimamente civilizados discute-se uma internet com um mínimo de 50 mbps, aqui, nesse rincão que está mais para curral de bovinos do que para país, em 41% das escolas ela não chega a 2 mbps. Como discutir novas tecnologias se por essas paragens a única tecnologia surgida em sala foi a mudança da cor do quadro, que era preto, passou para verde e hoje é branco?
Durante o já citado seminário, os professores foram agraciados com mais uma esmola que os governos adoram brindar seus professores: a partir de 2016 será ofertado cursos de mestrado nas áreas de educação física e pedagogia. Com um sorriso de satisfação (e sadismo) nos lábios, a nossa secretária de educação ainda falou que nossos valorosos mendigos... digo, professores, irão receber 30 diárias em janeiro e 15 em julho para fazer seus mestrados. Isso mesmo! O sujeito passa o ano inteiro numa sala de aula lotada, com uma carga horária escorchante e, durante as férias, vai estudar. Se quiser!
Redução de carga horária é assunto proibido!
E o pior é que ela foi bovinamente aplaudida. A insensata gratidão é uma característica dos mendigos letrados e profissionais.     

domingo, 20 de setembro de 2015

Schifaizfavoire – Mário Prata

Se você pretende ir à Portugal leia Schifaizfavoire. Se não pretende ir, leia do mesmo jeito apenas a título de curiosidade ou por pura diversão. É impossível não se divertir com o jornalista Mário Prata nesse e em outros dos seus livros. Publicado em 1993, o livro é fruto de uma temporada de dois anos que o jornalista passou em Portugal e mostra as dificuldades do brasileiro em se comunicar com os portugueses. Estranho não? Mas ao ler o livro, conclui-se que não falamos português, mas “brasileiro”, tantas são as diferenças entre os dois idiomas. Abaixo algumas expressões incompreensíveis para nós, brasileiros:
Estar com história = Estar menstruada

Estou numa cadela! = Estou num grande porre!

Por favor, não esqueça de carregar no autoclismo da retrete!  = Por favor, não esqueça de dar descarga na privada!

Estou-me a vir = Estou gozando

E há também várias palavras que tem significados completamente diferentes nos dois países:

Andar = apartamento

Apitadela = telefonema

Balneário = vestuário

Banheiro = salva vidas

Bica = café

Breque = peido

Durex = camisinha

Frigorífico = geladeira

Grelo = verdura

O livro é uma diversão só! E em sala de aula arranca boas gargalhadas dos alunos.

  

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Abaixo de zero – Bret Easton Ellis

Clay, protagonista de Abaixo de zero, está de férias da universidade onde cursa cinema e no retorno para casa reencontra seus antigos amigos do colégio e sua ex-namorada Blair, todos mergulhados no submundo das drogas, o que para ele foi a “mão na roda”, já que Clay também é usuário. O ambiente familiar também não é dos mais saudáveis: Clay é recebido como se não tivesse passado tanto tempo fora de casa. Abraços, refeições em família e desejo de boas festas eram artigos de luxo em sua casa.
O ambiente familiar deteriorado e a relação com Blair, namorada da época do colégio e que ainda acredita que o relacionamento existe, transformada numa atração física vazia, faz das férias de Clay e seus amigos uma busca incessante por alucinógenos, novas drogas e locais de encontro com seus traficantes. Tendo tudo o que o dinheiro pode comprar, festas, mulheres, bebidas, drogas e muita curtição, Clay começa a descobrir o quanto a sua existência é inútil. O vazio da inutilidade se transforma em melancolia, depressão, autodestruição e agressividade.
Livro de estreia do escritor americano Breat Easton Ellis, de 1985, quando o autor tinha apenas 21 anos, a mesma idade dos protagonistas do romance, Abaixo de zero chegou a ser chamado pelo jornal USA Today de “O apanhador no campo de centeio da geração MTV”. Adaptado para o cinema, dirigido por Marek Kanievska, o filme é centrado numa mensagem antidrogas, enquanto o livro se concentra no vazio existencial dos personagens.