domingo, 30 de agosto de 2015

Cenas de Nova York & outras viagens – Jack Kerouac


Um livrinho de pouco mais de 50 páginas, apropriado para se ler de um folego só, mas que desnuda o escritor Jack Kerouac e sua maneira de escrever. Assim poderia ser definido Cenas de Nova York & outras viagens, um livro marcadamente pessoal que começa exatamente por uma apresentação do autor feita por ele mesmo. É possível identificar nessa obra o mesmo movimento frenético da sua narrativa presente em outras obras suas.
Depois da auto apresentação, temos Cenas de Nova York, uma descrição de cada rua e beco da cidade. Mesmo sem nunca ter estado em Nova York (É o meu caso!), o leitor se sente passeando com Kerouac pela grande metrópole ou fica com a sensação de já ter estado lá. Melhor do que os relatos sobre a cidade é a citação de vários nomes da literatura e do show business com quem ele conviveu intimamente.
O texto seguinte é Sozinho no topo da montanha, relato feito a partir de sua experiência como vigia de incêndio na Floresta Nacional de Mont Baker, na divisa com o Canadá. Kerouac abandonou a vida agitada e boêmia de Nova York e resolveu se candidatar ao emprego na tentativa de se isolar de todos. Passou três meses numa cabana no meio do nada e o resultado é um texto repleto de reflexões sobre a... solidão.
“Nenhum homem deveria passar pela vida sem experimentar pelo menos uma vez a saudável e até aborrecida solidão em um lugar selvagem, dependendo exclusivamente de si mesmo e, com isso, aprendendo a descobrir sua verdadeira força oculta. - Aprendendo, por exemplo, a comer quando tem fome e a dormir quando tem sono.”
Em O vagabundo americano em extinção, Kerouac expõe seu espírito andarilho, relatando alguns casos da época em que viveu como ”vagabundo”. Por fim, temos um poema chamado Rimbaud, em homenagem ao poeta francês. Como não gosto de poesia, fico por aqui.  

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Tristessa – Jack Kerouac



Em 1955, numa viagem ao México, Jack Kerouac apaixonou-se por uma prostituta índia chamada Esperanza. A experiência deu origem ao livro Tristessa, um belo exemplo da prosa poética do autor, publicado pela primeira vez em 1960. No livro, Kerouac descreve de forma cruel o mundo de Tristessa, narrando a rotina de uma prostituta decaída e viciada em morfina errando pelos becos da Cidade do México.
Numa ambiente de pobreza e decadência no submundo da Cidade do México, Jack, um poeta norte-americano de convicções budistas, convive com a prostituta Tristessa, por quem se apaixonou, mas sem poder toca-la. O tempo de Tristessa é tomado pelas drogas e sua busca incessante em consegui-las. Num ambiente de miséria e desespero, Jack justifica o comportamento de Tristessa afirmando que tudo na vida é dor e sofrimento.
Enfim, a prostituta Tristessa é a personificação das drogas, Jack e seus amigos (entre eles Alen Ginsberg) são viciados em Tristessa. De todos os livros de Kerouac, é o mais triste e poético. Um livro de agonia da alma humana que a genialidade do autor consegue transformar em poesia: “Suave é o chuviscar que perturbou minha calma”. Uma história que dá pra ler de um fôlego.    

domingo, 23 de agosto de 2015

Cidade pequena, cidade grande – Jack Kerouac

Temos dois bons motivos para cultuar Cidade pequena, cidade grande. O primeiro motivo é que é o livro de estreia de Jack Kerouac, publicado em 1950. O segundo motivo é que ele antecede a técnica de escrita automática, característica dos outros livros do autor, que fez com que On the Road fosse escrito em três semanas e Big Sur em dez dias. Portanto é o único livro de Kerouac que foi escrito ao longo dos anos e não em poucos dias.
Segundo alguns críticos, seu estilo é único na vasta obra do autor, podendo ser comparado ao de Thomas Wolfe. A característica que não o diferencia das outras obras do autor é o seu caráter autobiográfico. O núcleo central da trama é a família Martin, mais precisamente Peter. Talentoso jogado de futebol americano, o jovem é agraciado com uma bolsa de estudos na cidade grande (Nova York) tendo que deixar a cidade pequena (Galloway) e sua família.
O livro também aborda as vidas dos outros sete filhos do casal Martin, como Joe e Francis. Uma típica família americana, dotada de energia e visão de vida, mas também desgastes, rachaduras e tristezas. Um romance sobre seres humanos que envelhecem, vencem e fracassam. Que enfrentam as vicissitudes da sua época, como a guerra e as crises econômicas. Entre o meio e o fim, é possível perceber o traço autobiográfico típico das obras de Kerouac quando os personagens se envolvem com o jazz, as drogas e as aventuras no mar e na estrada.
Um livro essencial para conhecer Kerouac e sua obra. 
MRA


quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Big Sur – Jack Kerouac

Se a literatura de Jack Kerouac é repleta de heroísmo existencialista, Big Sur pode ser considerado o romance da depressão, o lado dark do escritor. Depois do sucesso de On The Road, de 1958, Kerouac, que já não aliviava no consumo de álcool, passou a ingerir benzedrina e analgésicos em doses industriais, inclusive durante a gestação dos seus livros. No início dos anos 60, atormentado pelo sucesso alcançado pelos seus livros, o autor resolve se isolar de todos numa cabana sem eletricidade do amigo Lawrence Ferlinguetti.
Big Sur, de caráter autobiográfico, lançado em 1962, foi escrito a partir desse isolamento. Escrito em apenas dez dias (On The Road foi escrito em três semanas), mostra o sofrimento da existência caótica de Kerouac, a degradação da sua saúde, a descrença espiritual a não aceitação da condição de ícone de um movimento. Com suas descrições, divagações e alucinações, Kerouac escreve uma obra sonora e poética. E triste! Sim, triste.
Podemos dizer que Big Sur é uma espécie de continuação de On The Road. Enquanto On The Road mostra uma viagem de jovens escritores que, sem grana, só queriam conhecer o mundo e as pessoas para servirem de combustível para seus escritos, Big Sur mostra um escritor atormentado pelo sucesso, com a saúde mental e física em decadência e buscando nos seus conflitos internos combustível para escrever.
Mas Kerouac é Kerouac. E o livro é sensacional. 



domingo, 16 de agosto de 2015

O amor nos tempos de fúria – Lawrence Ferlinguetti

O poeta americano Lawrence Ferlinguetti, de origem ítalo-portuguesa, foi o fundador da editora e livraria City Lights, responsável pelo lançamento de grande parte dos autores beat. Mais conhecido por sua obra poética, Ferlinghetti também mostra talento para a prosa ao narrar a complicada paixão entre Annie e Julien. Ela, uma pintora americana, passional e idealista. Ele, um cético banqueiro português.
Tendo como pano de fundo a Paris do conturbado ano de 1968, Annie e Julian, já passados dos quarenta anos, se conhecem e, enquanto tentam ficar juntos, discutem as consequências das manifestações que os estudantes da Sorbonne promoviam pelas ruas de Paris. Enquanto ela está totalmente envolvida com os manifestantes, ele tenta convencê-la que, apesar de ser banqueiro, é anarquista e não consegue aderir aos manifestantes por acreditar que o mundo proveniente dos protestos não será livre.
Entrelaçando a história de ambos com os acontecimentos de 1968 em Paris, Ferlinghetti discorre sobre questões filosóficas, politicas e artísticas. Lançado originalmente em 1988, O amor nos tempos de fúria é uma obra sobre o amor que precisa triunfar por dentro da fúria e dos dilemas políticos e filosóficos. 

terça-feira, 11 de agosto de 2015

Almoço nu – William S. Burroughs -



O que dizer de Almoço nu? É um livro brutal, obsceno e desconcertante, nas melhores acepções dos termos, se é que vocês me entendem. Eu não entendi! Mas apreciei. E Almoço nu não é para ser entendido, apenas apreciado. O próprio Burroughs resume: “Não tenho lembrança precisa de ter escrito essas notas que agora são publicadas sob o título Almoço nu”. E não tem como lembrar. Ele confessa que escreveu a obra encharcado de doses industriais de todos os tipos de narcóticos disponíveis.
Apesar de mais velho e de origem aristocrática, Burroughs fez parte da geração Beat, ao lado de escritores como Jack Kerouac e Allen Ginsberg, lutando por uma nova literatura, liberdade de expressão e contra o moralismo capitalista. Antropólogo e psicólogo de formação, casou e teve filhos, mas encontrou a sua verdadeira paixão nos narcóticos, se tornando desde então, Willian Lee, seu alterego também drogado e de sexualidade duvidosa.
Escrito de forma desordenada numa quarto de hotel no Marrocos por um autor auto exilado, Almoço nu é um arrazoado de ideias esparsas abortadas por uma mente encharcada de entorpecentes. Na verdade, a obra pode ser lida como sendo cada parágrafo um texto a parte. Ou leia como quiser! O fato é que se você é muito sensível não leia esse clássico da literatura marginal.
   Só para ter uma ideia, um pequeno trecho do livro:
“Um sentinela fardado com um uniforme de pele humana, casaco negro e lustroso com botões de dentes amarelos e cariados, camisa elástica de reluzente morenice indiana, calças largas de bronzeado nórdico adolescente, sandálias feitas com as solas dos pés cheias de calos de um jovem agricultor malaio, um xale cinza-pardo envolto no pescoço e enfiado na camisa. (Cinza-pardo seria o tom obtido se fosse possível espalhar cinzas sob uma pele morena. É por vezes encontrado em mestiços de negro e branco; quando a mescla não é muito bem-sucedida, as cores separam-se como óleo e água...).”