terça-feira, 28 de junho de 2011

Duas eternidades

O sonho é o combustível da vida. Não se vive sem sonhar. Falo em sonhar acordado, fazer planos, traçar objetivos, metas. Nesse caso, escolhemos com que queremos sonhar. Quando se trata de sonhar dormindo, não temos escolhas. Muitas vezes sonhamos o que não queremos, sonhos que nos deixam, ao acordar, com uma sensação desagradável. Pior ainda quando temos pesadelos. Mas a melhor parte é quando, mesmo sem escolher, sonhamos com quem queremos. Acordamos de bem com a vida, com a sensação de que temos toda uma história para viver, mesmo sem ter a noção exata se essa história já começou ou ainda está para começar.

Quando sonho com você, ao acordar não consigo distinguir entre o que era sonho e o que é realidade. As sensações são as mesmas: a paixão, o desejo, o ciúme, a saudade. O sonho é solitário e nebuloso. Não com você! Ele se torna compartilhado e límpido. A sua voz é real, o seu cheiro é real, o seu toque é real, os pormenores são os mesmos da nossa realidade. Só o sonho é sonho. Sonhar com você é não ter pressa de acordar, é viver uma realidade em sonho. É sentir que você está sempre perto, mesmo quando estamos distantes. O sonho me aproxima de você de tal forma que parece real.

Acordo e tenho a impressão que você está deitada ao meu lado. Sinto você embaixo dos cobertores. De tão real, acredito que o colchão ainda guarda o seu calor. A sensação é de acalanto, de noite bem dormida, de coração confortado. Fico incontáveis minutos a imaginar se sonhei ou se passamos a noite toda juntos, dormindo de mãos dadas. Sei que sonhar com você é prenúncio de um dia bom, da mesma forma que viver próximo a ti é prenúncio de uma vida bem vivida. Levanto e continuo sonhando com você, com a certeza de que te amo em duas dimensões. Portanto, vou te amar por duas eternidades.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

O que mata é o "se"

A revista VEJA dessa semana, nas Páginas Amarelas, trás uma entrevista com o cirurgião cardíaco Leonardo Esteves Lima, que ajudou no atendimento à princesa Diana, quando do acidente que a vitimou em agosto de 2007. Segundo ele, a possibilidade de sobrevivência da princesa seria maior de dois erros tivessem sido evitados. O primeiro deles foi o tempo que a ambulância levou pra chegar até o hospital (levou vinte e seis minutos num trajeto que seria feito em dez); o segundo foi se a cirurgia de emergência realizada logo após a ambulância chegar ao hospital tivesse feita por um especialista em cirurgia torácica (foi feita por um clínico-geral). Leonardo enfatiza que esses dois erros possam ter sido cometidos pelo fato dos médicos terem tratado a paciente como uma celebridade que ela de fato era e não como uma paciente comum.

A morte, qualquer morte, não acontece por acaso. Mas também não é destino! Ela é fruto do erro. O que mata é o “se”. Se não fosse feito assim, fosse feito assado, ninguém morreria. Recentemente assisti o documentário “Sena”, sobre a trajetória e morte do piloto Airton sena. Nele, o comentarista Reginaldo Leme diz que a morte do piloto foi uma fatalidade, visto que ele não sofreu nenhum trauma no resto no corpo, apenas a lesão na cabeça provocada pelo braço da suspensão do carro. E se a barra de direção não tivesse quebrado em virtude de um defeito de fabricação ou erro humano na sua instalação? E se Sena tivesse resolvido não participar da corrida como tinha comentado no dia anterior? Não existem fatalidades, existem erros ou decisões tomadas erradas.

No caso da princesa Diana, outros erros foram cometidos. E se a princesa tivesse de cinto de segurança? E se o carro não estivesse em alta velocidade? E se o casal não tivesse a intenção de fugir dos paparazzi e se deixasse fotografar? A morte nos espreita esperando nossos erros. É equivocada a imagem da morte como uma senhora horrenda e decrépita. A morte é uma jovem enganadoramente bela, de pele branca e macia que nos induz ao erro durante toda a nossa vida, até que um determinado erro é demasiado grande para ser ignorado e somos levados em braços sedutoramente (e, mais uma vez, enganadoramente) aconchegantes. É como a lenda da Sereia que nos leva ao afogamento com o seu belo canto. É como a lenda dos Vampiros que nos leva a uma morte em vida com beijos irresistíveis. Se erros não forem cometidos, a morte não virá. Aí você pode perguntar: e quem morre de velhice? Onde está o erro? O erro está no tempo que não para!

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Lobão - 50 anos a mil

Acabei de ler a autobiografia de Lobão, 50 anos a mil, escrita pelo jornalista Cláudio Tognolli, que intercalou a narrativa do biografado com a compilação das notícias publicadas nos últimos trinta anos, como também transcreveu trechos de inúmeros processos que Lobão respondeu nos anos 80. É uma narrativa franca, escancarada e, acima de tudo, bem escrita. Trás à público os entreveros de Lobão com Herbert Viana e Caetano Veloso, entre outros (com quem Lobão não se desentedia?) Mas mostra também como se dava o processo criativo de uns artistas mais fecundos dos anos 80.

Tive acesso às músicas de Lobão quando era adolescente, lá pelos 15-16 anos. As suas sucessivas prisões por envolvimento com drogas, as suas músicas agressivas com letras contundentes e seu visual rebelde, tornaram-no ídolo de uma geração (na qual me incluo) e o herói da garotada (entre os quais também me incluo). O sorriso debochado diante das câmeras e o humor ácido das suas declarações faziam de Lobão não apenas o herói, mas o anti-herói. Mais do que contar a trajetória turbulenta de um artista rebelde, o livro traça o painel de uma das gerações mais criativas da música pop brasileira, construída e consagrada entre o final dos anos 70 e meados dos anos 80.

O livro mostra também que o ostracismo em que caiu o artista a partir do princípio dos anos 90 não se deveu apenas pelo boicote da sua obra por parte das gravadoras. Quando Lobão resolveu empregar um caráter mais existencialista/intimista nas letras das suas músicas, a recepção não foi a mesma que a de músicas como “Vida Bandida”, “Decadènce avec Elegànce”, “Me chama”, nos anos 80. Mesmo fazendo as pazes com as gravadoras e lançando um Acústico MTV, o artista não conseguiu recuperar o tempo perdido em seus devaneios existencialistas. Mesmo assim lobão não deixa de ter méritos. É um artista talentoso e vale à pena ler a sua trajetória.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Porvir

O escritor Sérgio Rodrigues não aconselha um escritor começar uma história afirmando que o personagem abriu os olhos ao acordar. Segundo ele é clichê! Tudo bem que Kafka começa “Metamorfose” mais ou menos dessa forma, mas tudo bem. Kafka pode. Se seguir o conselho do Sérgio Rodrigues vou ficar numa situação complicada por dois motivos: o primeiro é que sempre abro os olhos quando acordo (creio que não apenas eu); o segundo é que a história que quero contar começa quando eu acordo. Logo, não me resta muita alternativa. Sem querer comparar o incomparável: se Kafka pode, eu também posso. Mas Kafka não ficaria incomodado com a comparação se vivo fosse, pois não haveria concorrência entre nós, já que não sou escritor, quero apenas contar uma história de um sonho acordado, como também não tenho o talento do escritor tcheco. Mas vamos lá!

Abro os olhos quando acordo e fico tentando lembrar-me do sonho que tive. Durante muito tempo tive a certeza de que não sonhava. Mas como dizem que sempre sonhamos, cheguei à conclusão que, na realidade, eu nunca lembro o que sonho. Mas o sonho não lembrado deixa vestígios em mim, fragmentos que ficam lutando para alcançar a minha memória numa briga inútil. Ele nunca vence! Apesar de não lembrar-me do sonho dessa noite, o fragmento do sonho dá a impressão de ter sido bom, pois sinto uma leveza no espírito, uma lascívia irrefreável. Devo ter sonhado com sacanagem, concluo. Apesar de que devo sonhar com sacanagem quase todas as noites, pois sempre a libido desperta comigo.

Sempre acordo com o pênis intumescido (de pinto duro, em outras palavras). Uns dizem que o relaxamento da musculatura durante o sono faz com que uma maior quantidade de sangue migre pra os vasos do pênis, provocando a ereção; outros dizem que é o famoso “Tesão do mijo”. No meu caso é lascívia pura e simples. Acordo com a imaginação fertilíssima. Começo a imaginar todas as fantasias inconfessáveis. Imagino aquilo que não ouso imaginar no restante do dia, para não correr o risco de alguém ver ou ouvir a minha imaginação. O pênis fica cada vez mais duro à medida que a imaginação avança. Pressiono-o contra o colchão, transformando-o em amante imaginária. Nessas horas, torno-me mais audacioso e garanto a mim mesmo que vou mandar um e-mail ou uma mensagem de celular para a coadjuvante das minhas fantasias, confessando o inconfessável. Essa empolgação dura (sem trocadilhos, por favor) até a hora do banho, o melhor momento do dia. Depois vem o sepultamento no escritório... Até amanhã...

segunda-feira, 13 de junho de 2011

O estupro de Rafinha

Recentemente, Rafinha Bastos, comediante do CQC, afirmou em seu show que se Deus é brasileiro, castigou Rondônia, pois só tinha gente feia naquele estado. Foi uma confusão! O show em Porto Velho foi cancelado, teve deputado subindo na tribuna da Câmara Federal para exigir respeito ao povo rondoniense, comunidades em redes sociais na internet declararam ódio mortal e eterno ao comediante. Queriam até processá-lo! Uma reação exagerada, sem dúvidas. Afinal, Rafinha Bastos tem o direito de achar quem quer que seja feio. Mesmo que isso o leve a perder público num estado inteiro. Mas é um direito que o assiste. Os baianos são chamados de preguiçosos e nem por isso ficam tendo chiliques. E o que dizer dos gaúchos, que tem a sua masculinidade posta em dúvida em piadas?

No dia das mães, novamente Rafinha Bastos foi notícia. “Ae, órfãos! Dia triste hoje, hein?”. Essa foi uma piada de mau gosto! Se já não bastasse o cidadão não ter mãe, ainda vir um sujeito fazer piadas disso, não é aceitável. O incansável Rafinha bastos não se contentou com isso. Em seu show, segunda a edição brasileira da “Rilling Stone”, que fez uma reportagem a seu respeito, Rafinha disparou: “Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra caralho... Tá reclamando do que? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, foi uma oportunidade. Homem que fez isso não merece cadeia, merece um abraço.” Independente se é piada ou não, essa frase é de um mau gosto indiscutível. Não sei se a mãe do Rafinha Bastos é viva, mas tenho certeza que se ela fosse vítima de violência sexual, ele não perderia tempo discutindo questões estéticas.

Não discuto a competência de Rafinha bastos como comediante. Acho-o talentoso. Mas pela sua facilidade em se envolver em polêmicas desnecessária, vê-se que lhe falta tato, sensibilidade e bom senso. Não sou comediante, mas acredito que uma piada para ser engraçada tem que ter o tempo certo para ser dita. Como Rafinha deve saber disso mais do que eu, visto que ele é comediante e eu não, a única justificativa para essas estultices é a busca pela fama a qualquer custo. Do que ele não precisa, diga-se. O que importa é que para as mulheres que um dia sofreram abuso sexual, sejam bonitas ou feias, o sentimento é de um segundo estupro. Dessa vez feito pela insensatez de Rafinha Bastos.