quinta-feira, 31 de maio de 2012

Caro e efêmero


O que leva alguém a pagar U$ 12 milhões por uma obra que não durará muito tempo? É o caso da obra de arte acima, do artista inglês Damien Hirst, batizada de A impossibilidade física da morte na mente de quem está vivo, de 1995 e arrematada pelo milionário americano Steve Cohen, em 2005. Quando foi arrematada, já a barbatana quebrada e a pele enrugada e com um tom esverdeado. Estima-se que não tenha uma vida útil longa e que, se vendida, não alcançará metade do preço. Sem contar que é complicado coloca-la na sala de visita. Então para que compra-la?
Sabe-se que o que move o mercado de artes nem sempre é o pragmatismo econômico, mas a abundância de dinheiro e a vaidade pessoal. Possuir uma obra de arte de um artista de renome significa prestígio no seleto meio dos colecionadores de luxo. Somente isso pode explicar os valores estratosféricos pagos por obra de artes, mesmo aquelas de valor artístico reconhecido, como é o caso do quadro The Lock, do pintor britânico John Constable, que será leiloada em julho por um valor próximo de U$ 40 milhões.
Outra obra, Retrato de um artista sem barba, de Vincent Van Gogh, está avaliada num valor aproximado de U$ 100 milhões. Outra obra do pintor holandês, Retrato do Dr. Gachet, ultrapassa os U$ 130 milhões. Uma das versões da tela O grito, do pintor norueguês Edvard Munch (são quatro versões, pintadas entre 1893 e 1919), foi leiloada no mês passado por U$ 119,9 milhões. De acordo com o marchand do início do século passado, Joseph Henry Duveen, “Ao pagar caro pelo que não tem preço, você está pagando barato”. Algumas obras não tem preço exatamente por não valer o que se paga por elas.    

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Terão os venezuelanos mais sorte que os cubanos?


Em janeiro 1959, um grupo de guerrilheiros liderado por Fidel Castro e Che Guevara derrubou o governo corrupto e autoritário de Fulgêncio Batista. Foi um movimento necessário para trazer paz e justiça social aos cubanos. Desnecessário foram os novos detentores do poder passar mais de cinco décadas no poder fazendo tudo, menos promovendo a paz e a justiça social entre os cubanos, e implantando um arremedo de socialismo, que trouxe atraso ao país caribenho.
Durante esses mais de cinquenta anos, os cubanos esperaram ansiosamente pela solução biológica, ou seja, que a natureza e o tempo se encarregassem de Fidel & Cia. Enquanto ela não vinha, fugiam para Miami. O problema é que Fidel mumificou-se no poder e, quando não conseguia mais limpar a baba, passou o bastão para o irmão, que promove mudanças numa velocidade Barricheliana. Em 1999, chegou o poder na Venezuela o coronel Hugo Chávez, com uma versão venezuelana de reformas que ele batizou de Bolivariana. Era o socialismo cubano atravessando fronteiras!
A boa noticia (apenas para os venezuelanos) é que, ao que parece, a solução biológica se fará presente no caso de Hugo Chávez. Diagnosticado com câncer no ano passado, começou um tratamento em Cuba, terra dos seus gurus. Desde então muitas especulações surgem. Ainda no ano passado, um médico venezuelano falou que Chávez teria somente mais dois anos de vida. Foi obrigado a fugir do país.
Mas ao que parece, ele estava enganado. O tiranete, de acordo com os novos boatos, não chega nem a isso. Segundo a oposição, o governo venezuelano teria feito uma pesquisa em segredo para medir a popularidade de outros nomes do chavismo. Será que os venezuelanos terão mais sorte que os cubanos? 

terça-feira, 29 de maio de 2012

O corpo como um mural artístico


O homem sempre encarou, mesmo que inconscientemente, seu corpo como um mural artístico. No decorrer da história sempre adornamos nosso corpo. E o adorno não representa apenas um caráter estético, é também uma afirmação de individualidade perante os demais membros da coletividade. Em tempos idos, distinguia profissões, religiões, status e autoridade. Existem aqueles adornos removíveis, como pulseiras, brincos, braceletes, piercing, até mesmo a vestimenta. Como também há os adornos definitivos, como as tatuagens. E ainda os mais radicais, que implantam chifres, modificam a dentição e as orelhas, como a mexicana Maria José Cristerna, na foto acima, antes e depois da transformação. 
A pré-história contém vestígios de povos que cobriam o corpo com desenhos. Há registros de múmias tatuadas com mais de 4 mil anos no Egito. Mas apesar da tradição de pintar o corpo, o papa Adriano I a proibiu em 787, sob a alegação de que era coisa do demônio. Essa tradição foi constatada pelo navegador inglês James Cook, no século XVIII, e pelo pesquisador Charles Darwin, no século XIX. Por onde passaram, da Polinésia à América do Sul, constataram a tradição dos povos de marcar o corpo com tintas, por razões várias.
Apesar de toda essa tradição, e da apreciação que os orientais têm pela tatuagem, o Ocidente ainda vê os desenhos no corpo (e os adornos, de modo geral) com desconfiança. Não discuto o gosto de certos adornos, mas o direito de usufruir do seu corpo (e enfeitá-lo) como quiser. Sentir-se bem com o seu corpo é pré-requisito indispensável para obter qualidade de vida e saúde mental. O corpo, tão comum, pode transformar-se numa obra de arte singular, que faz bem ao dono e a quem o aprecia.  

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Cabruêra e Oliveira de Panelas


A banda paraibana Cabruêra tem treze anos de carreira, onze turnês na Europa e cinco CDs, mas é pouco conhecida no Brasil. O nome da banda é a transcrição oral do termo cabroeira, que quer dizer bando de pessoas ou cabras, animais que conseguem sobreviver em condições adversas graças à capacidade de comer tudo que encontram pela frente. Confesso que, apesar de já ter ouvido falar na banda, não conhecia seu trabalho.
Resolvi ir para o lançamento do quinto CD da Banda, Nordeste oculto, sexta passada no Teatro municipal Severino Cabral, em Campina Grande. O CD teve a direção artística do citarista Alberto Marsicano, introdutor da cítara no Brasil, instrumento usado em algumas faixas de Nordeste oculto. No show não há a presença de cítara, nem precisou.  Com produção simples, mas muito bom, ressaltando a excelente presença de palco do vocalista da banda, Arthur Pessoa.
O show foi aberto pelo poeta e repentista Oliveira de Panelas. O homem é um showman! Canta com uma voz de tenor e declama poesias, inclusive de improviso. Depois entra a banda, que canta as músicas do disco novo e canções de discos anteriores. A banda fez uma bela homenagem a Luiz Gonzaga, cantando a música A morte do vaqueiro. O CD está disponível par Download no site da banda. A versão física vem acompanhada do livro de Augusto Pessoa, cujas fotos são mostradas durante o show.   

sábado, 26 de maio de 2012

O torcedor


Existe uma diferença entre o torcedor e o amante do futebol. Para este basta um bom espetáculo de futebol e que vença o melhor para dar-se por satisfeito. O torcedor não! Só o espetáculo não basta. Ele tem que torcer. O seu time não está jogando? Ele torce assim mesmo. Com uma pequena diferença: ele torce contra. E se angustia tanto como se o seu time estivesse em campo. No afã de torcer contra, ele rói unha, a mão fica gelada, dá urros com gols perdidos. O fato de torcer contra um, não quer dizer que esteja torcendo pelo outro. Não! Está torcendo contra mesmo. E não basta vencer o melhor. O time para quem ele está torcendo contra tem que perder.
O amante do futebol é equilibrado e sensato. O torcedor é desequilibrado. Somente lhe interessa o resultado para o qual torce. Essa semana estive nessa situação. Assistindo Boca Juniors, da Argentina, e Fluminense, me vi torcendo contra o Fluminense. Estava torcendo pelo Boca? Também não. Não nutro a menor simpatia pelo futebol argentino. Até acho que o Fluminense é muito mais time do que o Boca. Mas torci contra o Fluminense como se estivesse torcendo pelo meu time. Muito podem dizer: mas é um time brasileiro contra um argentino! É brasileiro, mas não é o meu time. Portanto, torço contra.
E não me venham com aquele discurso politicamente correto, típico dos narradores de televisão, de que o fluminense era o Brasil na Copa Libertadores. Não era! A seleção brasileiro tem a camisa amarela e não tricolor. Outro discurso, também típico dos narradores: é Brasil contra argentina. Também não é! Era o Fluminense, por quem eu torci contra, e o Boca Juniors, da Argentina, um timinho medíocre, mas que sabe como ninguém disputar a Copa Libertadores. Não sei se serve de consolo aos tricolores cariocas, mas eu também torci contra o Vasco e torcerei contra o Corinthians e Santos. 

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Sucessos onomatopaicos


Comparado às músicas com refrões repetitivos de onomatopeias que estão surgindo, Michel Teló, com seu “Sábado, na balada, a galera começou a dançar”, virou poeta. São ruídos bucais que só querem dizer alguém coisa se acompanhados de gestos ou movimentos dos quadris. E Neymar parece ser o padrinho preferido dos sucessos onomatopaicos. Primeiro foi o “Eu quero tchu, eu quero tchá”, da dupla João Lucas e Marcelo, que o craque usou a coreografia para comemorar seus gols. Agora é o “Ai, ai! Ai, ai, ai, ai! Assim você mata o papai”, do grupo Sorriso maroto. Ou foi o contrário, não sei, são sons tão parecidos.
Mas antes já existiam, mesmo sem apadrinhamento famoso, o  “tcherere tchê tchê” e o  “lê lê lê”. O que isso quer dizer, só vendo o gesto que acompanha o ruído bucal. Mas o uso de onomatopeias ou ruídos bucais não é algo recente. Carmem Miranda já usava na década de 40 na música “Chica Chica bom chic”. O título em si já uma onomatopeia. O venerado João Gilberto também usou, nos anos 50, na musica “Bim bom”, que tem uma letra ridícula (que heresia!): "Bim bom bim/ Bim bom bom/É só isso o meu baião/ e não tem mais nada não”. Tem mesmo não, João!
Jorge Bem Jor também usou na lindíssima “Taj Mahal”: “Tê tê, têtêretê Tê tê, têtêretê...”. eu não vou nem falar em “Ilariê” da Xuxa ou no “Xibom bom” do Grupo as meninas, de 1999. Vou pular para o venerável, aquele que é unanimidade, Chico Buarque. Ano passado ele usou esses ruídos bucais na música “Se eu soubesse”: “Mas acontece que eu sorri pra ti/ e ai, larari, lairiri, pom, pom, pom”. Veja que o mau gosto na hora de compor não é uma exclusividade de sertanejos universitários. Os bambambãs (com perdão do trocadilho) também têm.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

A segunda vez que te conheci – Marcelo Rubens Paiva


O livro A segunda vez que te conheci, de Marcelo Rubens Paiva, é daquele tipo que você ler quando está muito ocupado, quando o tempo é curto, não exige muita concentração. Isso acontece por que o estilo do autor faz você imaginar que ele está te contando a história num bate papo, numa roda de amigos. Os parágrafos são curtos, a leitura flui com facilidade. Sem contar que é uma história interessante, cheia de reviravoltas, suspenses e surpresas.
Raul é um cara que sabe o que quer, tanto no trabalho como no amor. Mas é abandonado pela mulher por causa do trabalho. Casa com a melhor amiga da ex e é abandonado novamente. Dessa vez perde também o emprego de jornalista numa conceituada revista, demitido por um sujeito que tem a metade da sua idade. É a partir daí que ele resolve mudar radicalmente de vida.
Para preencher o vazio que tomou conta da sua vida, sem mulher e emprego, Raul o preenche com mini saias, decotes, calça brancas,  batons chamativos e mulheres que ele passou a chamar de suas “meninas”. Ou seja, ele virou cafetão. Elas já tinham a profissão “cadastrada número 5.198: garota de programa, meretriz, messalina, michê, mulher da vida, prostituta, puta, quenga, rapariga”, como diz o autor. Apesar de toda a reviravolta na sua vida, Raul se recusa a acreditar que o amor que sentia pela primeira mulher, Ariela, tenha acabado e nunca perde a crença na reconciliação. Um bom livro... 

quarta-feira, 23 de maio de 2012

O centenário de Nelson Rodrigues


Agora em agosto o dramaturgo, jornalista e escritor Nelson Rodrigues faria cem anos. Nascido em Pernambuco, era o mais carioca dos nordestinos, pois se mudou para o Rio de Janeiro aos quatro anos, por causa de problemas políticos enfrentados pelo pai. É do cenário da sua infância, onde imperava as solteironas ressentidas, as viúvas tristes e vizinhas fofoqueiras, que Nelson tirou os personagens da sua vida literária. Aos quatro anos, Nelson foi proibido de frequentar a casa da vizinha por ter sido flagrado por ela aos beijos com sua filha de três anos. Aos sete, redigiu uma redação para um concurso na escola. Tema: adultério. Apesar do desconforto entre os professores, foi impossível não reconhecer as qualidades do texto. A professora, para não ter que ler a redação na sala, inventou um empate e leu a outra composição.
Aos catorze, foi expulso da escola por contestar os professores, principalmente os de português e história. Por essa época já trabalhava como repórter de policia no jornal do pai, o A manhã. Chamava a atenção de todos a forma dramática como Nelson relatava os crimes que ele cobria. Em 1927, abandona a escola para nunca mais voltar, para desespero do pai. Em 1928 passa a ter uma coluna própria, perdendo-a logo depois por fazer sérias críticas a Ruy Barbosa. No mesmo ano, seu pai perde o jornal, afundado em dívidas.
Menos de dois meses depois, Mário, pai de Nelson, funda outro jornal, Crítica.  Em dezembro de 1929 o jornal publica uma noticia sobre a separação de Sylvia e José Thibau Jr, membros da alta sociedade carioca. No dia seguinte, Sylvia entra na redação e não encontrando Mário, dá um tiro em Roberto, irmão de Nelson, que presencia tudo. Roberto morre no dia seguinte. Mário Rodrigues morre 67 dias depois, aos 44 anos, de derrame cerebral. A revolução de 30, de quem os Rodrigues foram ferrenhos opositores, vai deixa-los numa situação financeira delicada.
Em 1934, é diagnosticada uma tuberculose, o que o obriga a ficar catorze meses num sanatório. Em 1936, seu irmão, Jofre, morre da mesma doença. Em 1940 casa com Elza, colega do jornal O Globo. Foi a situação de penúria financeira (Elza pediu demissão a pedido de Nelson e estava grávida) que fez Nelson começar a escrever para o teatro. Em 1941, escreve sua primeira peça, A mulher sem pecado, que só viria a ser encenada em 1942 sem nenhuma repercussão. Em 1943, escreve Vestido de noiva, que estreou no final do mesmo ano com estrondoso sucesso. O sucesso trouxe consigo um novo emprego na revista O cruzeiro. Lá passou a escrever um folhetim, surgindo daí, Susana Flag e Meu destino é pecar.
Daí em diante, Nelson conheceu o sucesso como escritor e dramaturgo. Foram várias peças: Anjo negro, Senhora dos afogados, Beijo no asfalto, entre outras. Nelson se notabilizou por ser um frasista, um aforista. Seus alvos preferidos eram as mulheres (“O ginecologista é o adultério da mulher fiel”, “Toda mulher bonita é um pouco namorada lésbica de si mesma”), o amor e o casamento (“Dinheiro compra até amor verdadeiro”, “O marido traído não dever ser o último a saber. Ele não deve saber nunca!”, “Só o cinismo redime um casamento. É preciso muito cinismo para que um casal chegue às bodas de ouro”).
Durante a ditadura militar, que Nelson apoiava, seu filho foi preso. Depois de vários dias desaparecido nos porões da repressão, ele foi encontrado pelo pai, que usou da sua influência para encontrar o filho. Estava bastante machucado em função das torturas sofridas. Os militares queria que Nelson fosse à imprensa dizer que seu filho fora encontrado e não fora torturado, numa tentativa de convencer a opinião pública de que no Brasil não havia tortura. Nelson foi a imprensa e disse: “encontrei meu filho. Ele está vivo.” Nelson morreu em no dia 21 de dezembro de 1980, no mesmo dia em que acertou os treze pontos na loteria esportiva.  

terça-feira, 22 de maio de 2012

Trono de vidro – Antônio Olinto


A trilogia Alma da África, de Antonio Olinto é marcada por protagonistas de personalidades fortes. No volume um era a velha Mariana, filha de escravos e que migrou com a avó, a mãe e dois irmãos de volta para a África e construiu um império vendendo água. No volume dois era Abionan, a vendedora de mercado que queria ter um filho e fazer dele o rei de Keto. Essas duas personagens aparecem em Trono de vidro, o volume três da trilogia, mas a protagonista de personalidade forte do romance é a jovem Mariana, neta da velha Mariana e filha de Sebastian Silva, presidente de Zorei assassinado no final do volume um.
A história se passa em 1985, quando a jovem Mariana, após estudar na França, retorna à África e é acometida de constantes lembranças do pai morto em 1968. Essas lembranças vão despertar nela o desejo de voltar à Zorei, que vivia sob uma ditadura militar. A partir daí ela vai liderar um movimento que os seus partidários chamaram de “sebastianismo”, uma alusão ao seu pai e que se inspirou no sebastianismo português, que era a crença na volta de D. Sebastião, rei morto na batalha de Alcácer-Quibir. O objetivo do movimento era tomar o poder democraticamente usando, para isso, a popularidade do pai de Mariana na época em que ocupou a presidência do país.
Olinto consegue mostrar de forma muito competente os vícios da política em países onde imperava a miséria nos anos 80: fraudes eleitorais, manipulação, censura, repressão. E desse jogo de manipulação do eleitorado não fica de fora a jovem Mariana, que adota um nome ioruba, Ilufemi, para melhor ser aceita pelo ´povo e transforma o movimento político que liderava em movimento messiânico. Dos três volumes, esse é, com certeza, o mais eletrizante e tenso. Vale a pena ler... 

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Preocupação de pai


Na volta da escola, pai e filha, de 12 anos, conversam:
- Pai, o Guilherme sofreu um acidente.
- Quem é Guilherme?
- Meu namorado, pai.
- O que aconteceu com ele?
- Foi atropelado.
- Amassou muito o carro?
- Que consideração!
- O que foi minha filha?
- Nada. Não foi um carro, foi uma moto.
- O motoqueiro está bem?
- Pai!    

sábado, 19 de maio de 2012

O que eu estou fazendo aqui?


Confesso que tenho uma visão pessimista da humanidade. Acho o ser humano, de modo geral, enfadonho, egoísta e com uma tendência indelével para o mal. Depois de ler uma reportagem na revista SUPERINTERESSANTE sobre o que aconteceria na terra se a humanidade desaparecesse, essa minha opinião ficou um pouco mais acentuada, mesmo levando em conta que a reportagem baseia-se em conjecturas.
Se a humanidade sumisse da face da terra, aquele totó que você tem em casa, tão dócil e fiel, no máximo em vinte anos se transformaria num caçador implacável e num assassino inclemente. E o rio Tietê, que de tão poluído já está quase sólido? No mesmo período ficaria totalmente limpo. Veja como fazemos merda, literalmente. Em 70 anos, a camada de ozônio não teria mais buraco, mesmo com as vacas soltando pum.
A temperatura do planeta, após 300 anos, tenderia a cair pela falta de emissão de CO2. Pena que os fabricantes de vestuários não vão estar mais aqui. Após 5 mil anos, a mata atlântica tomaria conta de São Paulo. Uma boa notícia: após milhões de anos, o petróleo abundaria. É pena que dê para esperar tanto tempo pra gasolina baixar de preço. Diante de tantas informações utilíssimas, o último a sair apaga a luz, fecha a porta e joga a chave fora. 

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Só por causa de uma musiquinha?



O rapper Emicida foi preso em Belo Horizonte no último domingo acusado de desacato a autoridade. O motivo da prisão seria a música “Dedo na ferida”, em que o rapper fala de repressão e critica a polícia no episódio de reintegração de posse da favela Pinheirinho, em São José dos Campos, interior de São Paulo. Quando o rapper cantava a música, o público fez gestos obscenos com o dedo para os PMs que estavam no local do show.
Eu não sei o que é pior: se a música que tem uma letra de gosto duvidosíssimo ou se a PM prender um sujeito que estava cantando uma música de gosto duvidosíssimo.  "De violência / sob coturnos de quem dita decência / Homens de farda são maus / era do caos / Frios como halls, engatilha e plau! / Carniceiros ganham prêmios na terra onde bebês respiram gás lacrimogêneo", diz a letra. Algo parecido aconteceu com a banda Planet Hemp, mais ou menos uma década atrás por apologia às drogas.
Mudando de pau pra cacete, mas não mudando muito, recentemente o prefeito de Caririaçu, no Ceará, inaugurou um telefone público (foto de cima). É isso mesmo! Com direito a balõezinhos e fita inaugural. E, claro, “papagaios de pirata” à vontade. Como poderíamos chamar isso? Desacato ao bom senso?
Aqui em Rondônia, mas precisamente em Cacoal, o prefeito Padre Franco resolveu inaugurar um semáforo (foto de baixo). Um semáforo!!! Tudo bem que foi o primeiro da cidade. Mas com a presença do vice-governador e um deputado estadual? E, claro, “papagaios de pirata” recebendo diárias para se deslocar até o local de entrega da “obra”. Por que viajar quilômetros para inaugurar obra tão importante de graça é inviável.  Sem contar vereadores da “base de apoio” do prefeito. Como deveríamos chamar isso? Apologia a desinteligência do eleitor?
Qual é a música?
Chama a PM!!!!!!!!!!!!!!!!!
    

quinta-feira, 17 de maio de 2012

A literatura na telona


Essa semana estava assistindo Bufo & Spalanzani, um ótimo policial brasileiro, dirigido por Flávio R. Tambelini e baseado no livro homônimo de Rubem Fonseca. Fiquei a pensar em como a telona é dependente da literatura. São inúmeros os exemplos: Harry Potter, Ben Hur, Xangô de Baker Street, entre muitos outros. Raro é o contrário: um filme transformar-se em livro. Confesso que, não sendo um apaixonado por cinema, apenas um “simpatizante”, prefiro ler a assistir.
O 65º Festival de Cannes corrobora essa ideia. O livro de Jack Kerouac, On the road, será adaptado para o cinema dirigido por Valter Sales e produzido por Francis Ford Coppola.  Cosmópolis, baseado no romance de Don de Lillo, será estrelado pelo bonitão de Crepúsculo, Robert Pattinson, e será dirigido por David Cronenberg. Ambos os filmes serão lançados nos cinemas em 23 de maio. Entre os filmes franceses também há uma adaptação de Eurídice, de Jean Anouilh.
A série de livros infantis Ernest e Célestine, de Gabriele Vincent, com roteiro escrito pelo escritor Daniel Pennac. Meu sentimento por essa prevalência da literatura na telona é ambíguo. Ao mesmo tempo em que mostra importância da literatura, pode significar mais pessoas lendo menos. Para que o “sacrifício” da leitura, a mentalização do que está na página do livro, se o cinema já traz tudo prontinho?    

quarta-feira, 16 de maio de 2012

A seca, sempre a seca


Eu cresci ouvindo falar em seca. Entrei na universidade no inicio dos anos 90 e estudei que ela castiga o nordestino  desde o período colonial e tem seus efeitos multiplicados por causa do que se convencionava chamar de “Indústria da seca”. Lá se vão cerca de 30 anos e a história não mudou: o nordeste está passando por um novo período de estiagem e os efeitos são exatamente os mesmos. Nada mudou com a experiência e com as tecnologias criadas nas últimas quatro décadas. Os animais continuam morrendo de sede, o milho não “emboneca”, a lavoura perece, o sertanejo tem que andar quilômetros para encontrar água barrenta, o riacho seca e por aí vai.
Conclui-se que a seca continua a mesma por que não há interesse de políticos locais em acabar com ela. E as noticias que vem de lá confirmam isso. Em Pernambuco, que tem 66 municípios em estado de emergência, os “pipeiros”, muitos deles candidatos a vereador, que se aproveitam da situação para ganhar votos. Outro fato estarrecedor é o desvio de água por parte de grandes produtores para abastecer suas lavouras e até mesmo para abastecer um tanque com 50 mil peixes em Ouricuri. A Compesa (Companhia Pernambucana de Saneamento) tem feito operações para conter esses desvios com uso até de helicópteros.
Na Bahia, 234 municípios decretaram estado de emergência. No Piauí, 152 estão sendo atingidos pela estiagem, que dura desde julho do ano passado. Para minorar os efeitos da seca, o Governo Federal liberou R$ 2,7 Bilhões e anunciou o Bolsa Seca, no valor de R$ 400,00. O que se questiona é: qual será o destino desse recurso? O mesmo da água, que beneficia uns poucos apaniguados? Será, também com a água, moeda de troca por voto?
Durante o governo Lula, surgiu o projeto de transposição do rio São Francisco, que gerou histeria em setores da intelectualidade e até greve de fome de um padre ribeirinho. Não sei em que pé está o projeto, mas é uma das soluções para amenizar o problema. Outra solução seria a construção de poços artesianos nas regiões historicamente assoladas pela seca. Pode ser oneroso, mas bem menos do que a miséria gerada pela falta d’água. A solução pode não vir de cima, mas de baixo, basta querer olhar para o lugar certo.   

terça-feira, 15 de maio de 2012

Loucura e arte


É comum associarmos genialidade a loucura. Mas nem sempre o gênio é louco. Um estudo, feito em 1994, pelo psiquiatra Felix Post (“Criatividade e psicopatologia: Um estudo de 291 personalidades”), analisou a biografia de grandes cientistas, filósofos, estadistas, pintores e músicos e tentou achar a prevalência de distúrbios mentais nesses indivíduos. O resultado é que eles são até normaizinhos. Entre os cientistas, um terço não apresentava nenhum indicio psicopatológico relevante. Entre políticos e compositores, a incidência de loucura era baixíssima.
No entanto, entre os grupos pesquisados, um deles destoa: o dos escritores. Entre eles, 88% possuíam traços de psicopatologia acentuados e 72% sofriam de depressão profunda, índices espantosamente altos em relação ao restante da população. E dentro do grupo, os poetas são mais propensos ao transtorno bipolar, mas são mais sociáveis e menos introspectivos do que os romancistas que têm uma inclinação grave à depressão, ao vicio e à disfunção afetiva.  
Cinquenta escritores foram analisados. Apenas um foi considerado normal: Guy de Maupassant. Os mais desequilibrados? Tolstói, Fitzgerald, Hemingway e Joyce. O que faz do gênio um louco? Para Hemingway, o bom escritor é basicamente um solitário. Conclui-se que, para ser um bom escritor, não há a necessidade de ser louco, mas ajuda. Para eles, a loucura é uma porta aberta para o mundo. Pena que eu seja normalzinho... 

segunda-feira, 14 de maio de 2012

O sonho


- Tive um sonho estranho.
- Que sonho?
- Sonhei com Deus.
- Estranho não, cara. Legal sonhar com Deus. Sonhou o que?
- Ele falou pra mim que não existe.
- Você tá louco? Como você diz uma coisa dessas?
- Louco tá Ele! Foi Ele que disse.
- Tá louco de novo? Chamando Deus de louco?
- Eu não disse nada. Foi Ele que falou que não existe.
- Sonho estranho.
- Põe estranho nisso.  
- E o que mais Ele disse?
- Nada. Só disse: “Eu não existo”.
- Estranho. O que mais?
- Nada. Só isso.
- E como ele era?
- Não era.
- ?
- Não era, cara. Não era.
- Como “não era”?
- Se era, não vi. Só ouvi.
- Acho que você tá ficando louco.
- Eu? Louco?
- É.
- O Próprio me “aparece” em sonho dizendo que não existe, você duvida d’Ele e o louco sou eu.
- Você é louco por ter sonhado essa loucura.
- Eu não sonhei por que quis eu não pedi pra sonhar. Sonhei por que sonhei.
- Você está precisando rezar.
- Estou?
- Está.
- Por quê?
 - Você está perturbado. Precisa pensar em jesus.
- E porque eu preciso pensar nele?
- Ele pagou com a vida o preço dos nossos pecados. Somente ele pode lhe trazer paz.
- Se ele já fez isso por mim, então estou livre. Não devo mais nada. 
- Pra onde você vai?
- Dormir, ver se Ele tem mais alguma coisa pra me dizer.

sábado, 12 de maio de 2012

Convivência e aceitação


Semana passada, durante um show de Luan Santana, no Rio de Janeiro, quando o cantor começou a cantar “Amar não é pecado”, dois rapazes gays começaram a se beijar. Um pai com o filho pequeno no ombro reclamou e chamou a polícia. “Vão fazer isso em casa”, protestou. Esse pai deve ser daqueles que dizem que “não tem nada contra os gays”. Tem! Se fosse um casal heterossexual e ele nada diria. E não me venham com aquela história de que gays não podem se beijar na frente de crianças. Não apenas podem como devem.
A tolerância surge da educação e da convivência. Aprende-se a tolerar convivendo. A sociedade nunca será tolerante com a relação homossexual se não conviver com ela. O seu filho presenciou um beijo gay? Diga-lhe que isso é natural, que o diferente não é anormal nem errado. É apenas diferente! Da mesma forma que agimos naturalmente diante de um casal heterossexual que se beija, devemos fazer o mesmo diante de um casal gay. E ensinar aos nossos filhos a agir da mesma forma.
A postura desse pai “zeloso” serve apenas para perpetuar o preconceito e a discriminação. Beijo gay não é caso de polícia! E não adianta espernear, pois a tendência da legislação e dos valores da sociedade é da aceitação. Gradualmente essa cena passa a ser corriqueira.  A intolerância e o preconceito perdem espaço para a diversidade. 

sexta-feira, 11 de maio de 2012

O centenário de Luiz Gonzaga


Esse ano, as festas juninas no Nordeste homenagearão Luiz Gonzaga pelos cem anos de seu nascimento. Nada mais justo! Luiz Gonzaga encarna com perfeição e dá voz ao nordestino de modo geral e ao sertanejo em particular. Nascido em 13 de dezembro de 1912 em Exu, sertão de Pernambuco, recebeu seu nome por devoção ao catolicismo, uma tradição do sertanejo: Luiz por que era dia de santa Luzia; Gonzaga por sugestão do vigário que o batizou e Nascimento por ser o mês em que Maria deu à luz Jesus.
Filho do único sanfoneiro da região, aos oito anos já empunhava uma sanfona e recebia cachê para isso. Aos 14 foi para o Rio de Janeiro. Não deu certo e retornou para o Ceará, onde aumentou a idade para ingressar no exército e virar o soldado Nascimento. Ficou no exército até 1939, quando se desligou e retornou ao Rio, onde tocou pela primeira vez num palco, no cabaré O Tabu. Muito forró? Que nada! Por influência da II Guerra, os ritmos estrangeiros invadiam o país e Gonzagão era obrigado a tocar blues e Fox trot. Curiosamente, os trinta primeiros discos de Gonzaga foram instrumentais. Para a gravadora, ele era apenas sanfoneiro!
Insisto em dizer que Gonzagão foi um gênio na hora de compor, pois conseguia colocar nas letras de suas músicas o espirito nordestino, principalmente o sertanejo. Um exemplo dessa genialidade está em Asa Branca, composta em parceria com Humberto Teixeira em 1947, que você pode ouvir no link abaixo. A genialidade de Gonzaga também estava na hora de escolher músicas de outros compositores. O segundo link tem Tropeiros da Borborema, de Raimundo Asfora e Rosil Cavalcanti, que é considerada o hino não oficial de Campina Grande. Uma música linda que na voz de Gonzaga causa arrepios nos campinenses, como eu.  
As comemorações pelo centenário de nascimento desse que é um ícone da cultura nordestina são mais do que merecidas. Gonzagão sempre conseguiu colocar nas suas músicas temas que são muito caros ao povo do Nordeste, como a seca, a condição social e econômica, os casos amorosos, o amor e a saudade da terra natal. O Rei do Baião sempre fará parte da cultura do nordestino onde quer que eles, os nordestinos e Luiz Gonzaga, estejam. Quero fazer parte dessa festa...

quinta-feira, 10 de maio de 2012

O guru verde amadureceu


James Lovelock é um senhor de 92 anos, guru dos ecologistas mais radicais, os ecochatos ou ecoxiitas. Em 2007, numa entrevista para a revista Rolling Stone, previu que até 2020 as secas seriam lugar comum no mundo; que até 2040 o Saara invadiria a Europa, parte dos Estados Unidos ficariam inabitáveis por causa da desertificação e de enchentes provocadas pelo aumento do nível do mar; que a falta de alimentos empurraria os chineses para a Sibéria, o que ocasionaria uma guerra entre Rússia e China; e que até 2100, a população da terra estaria reduzida a 500 milhões de sobreviventes. Tudo isso em virtude do aquecimento global que, pelas contas do Lovelock, aumentaria a temperatura na terra em 8 graus Celsius.
A terra, se confirmadas as previsões apocalípticas do ecologista, se transformaria numa frigideira. Os ovos sairiam da galinha e cairiam direto no pão! Profeticamente, na mesma entrevista, Lovelock disse que “posso está errado a respeito de tudo isso”. Digo profeticamente por que ele admitiu, recentemente, que estava errado “a respeito de tudo isso”. Ele agora admite que “não tem nada de muito emocionante acontecendo agora”. A previsão é que a temperatura na terra suba dois graus Celsius até o fim do século, quatro vezes menos do que previu o apocalíptico Lovelock.
As visões catastrofistas sobre o meio ambiente sempre existiram. Mas é de se estranhar que o pensamento acadêmico ocidental somente tenha começado a lhes dá crédito quando parte dos povos pobres e menos desenvolvidos do planeta começaram a ter acesso às vantagens da vida moderna e ao progresso econômico. Será que teremos de suspender o desenvolvimento para evitar o apocalipse verde? Ninguém, em sã consciência, deseja a destruição do meio ambiente aleatoriamente. Mas o desenvolvimento é necessário. A população cresce e há a necessidade imperiosa de alimentá-la. As mesmas mentes férteis que criam o “futuro frigideira”, podem criar modelos de desenvolvimento sustentável para o planeta. 

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Criação – Gore Vidal


O escritor americano Gore Vidal sempre esteve dividido entre a literatura e a politica. Em 1960, chegou a concorrer ao Congresso americano, sem sucesso, e escreveu sete romances que tinham a pretensão de ser uma biografia dos Estados unidos, onde Gore expunha seu pensamento político. Além dos romances com alto teor político, Gore também se destaca pelos romances históricos. É o caso de Criação (1981), romance que se passa na Pérsia 445 a.C. e tem como personagem principal Ciro Espítama, neto de Zoroastro, que aos oito anos, presenciará o assassinato do avô profeta, o que influenciará toda sua vida. Estimulado pelo sobrinho, nada menos do que Demócrito de Abdera, o filósofo pré-socrático, narrará toda a sua vida, que resulta no próprio livro.
O fato de ter testemunhado a morte do avô profeta faz com que ele e sua mãe se tornem protegidos do rei Dario, da Pérsia. Como neto de Zoroastro, deveria ser sacerdote, mas é educado segundo a disciplina militar persa e trona-se embaixador, viajando para a Índia e para Catai (atual China) em missão diplomática. Na Índia casa, tem filhos e conhece Buda, com quem trava diálogos e compara a doutrina indiana com o zoroastrismo, a doutrina do seu avô. Ao retornar à Pérsia, Ciro torna-se “amigo do rei”, um cargo de prestígio. Após a morte de Dario, ascende ao trono o filho deste e amigo de infância de Ciro, Xerxes, que o manda em missão para Catai. Lá, conhece Confúcio e a doutrina chinesa e, mais uma vez, fará comparações com o zoroastrismo.          
É um livro fruto de minuciosa pesquisa histórica, que permite ao leitor reconstruir mentalmente a época e imaginar o cotidiano das pessoas que viveram no século V a. C. em três grandes civilizações da antiguidade: a Pérsia, a Índia e a China. Não apenas isso. Gore Vidal nos coloca diante de três sistemas filosóficos que trazem questões até hoje discutidas: a liberdade, a justiça, a morte, a existência ou não da alma e a sua imortalidade. É um livro que, em alguns momentos fica denso, pesado, mas que vale a pena ler e deliciar-se com os diálogos entre os personagens históricos e Ciro, um personagem que nasceu da genialidade de Gore Vidal.  

terça-feira, 8 de maio de 2012

O músico ninja e o policial paciente


O fato aconteceu na última sexta-feira, em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. Em pleno dia útil, às oito horas da manhã, o músico Leonardo Mourão dirigia embriagado e bateu no carro de um policial militar a paisana. O que se viu depois cômica que poderia ter sido trágica pelo estado de embriaguez do músico e se o policial não tivesse tido a presença de espírito de agir corretamente e com uma paciência de monge budista diante da reação do bêbado. Como se pode ver no link abaixo.
O rapaz se mostrou agressivo, mas no estado de embriaguez em que se encontrava se tornou pateticamente inofensivo. Diante disso, o policial tomou-lhe a chave do carro para que ele não se evadisse do local. Começou uma “brincadeira” de gato e rato. Na correria, sobrou para o cinegrafista da Band, que levou um esbarrão do músico e machucou-se levemente. Em plena via pública, o bêbado fazia poses de lutador de artes marciais para agredir o policial, mas só conseguia cair de forma ridícula.
Como era franzino e estava completamente embriagado, bastava um peteleco do policial para desmontá-lo. Ele terminou sendo preso e indiciado num rosário de crimes. Se eu estivesse no lugar desse rapaz, ficaria um mês escondido com uma ressaca moral apocalíptica. Já o policial merecia um prêmio pela capacidade de administrar uma situação cômica, mas delicada, e pela paciência em aguentar um bebum chato se achando ninja. 


segunda-feira, 7 de maio de 2012

Um concerto brandenburguês*


Ouço Cecília sem dizer palavra. Os cabelos escorridos, toda ela de uma beleza imperfeita, mas bela, triste, e bela como uma música de Bach. Suave, virtuose, forte como uma selvagem. Ouço mesmo seus gritos selvagens e seus corcéis quando o bando fragoroso se aproxima cada vez mais. Há um momento em que se chega a ouvir o relinchar de cavalos, representado pelos instrumentos de sopro. O ritmo torna-se crescente, toda a orquestra dentro de Cecília, unindo suas forças para atingir o ápice com os metais e a detonar dos címbalos. Tudo isso desaparece, magicamente, logo após, deixando apenas um breve eco dos tambores, como o tropel dos cavalos. Cecília. Bach! Cecília. Como uma música de Bach, música de Bach.
Sinto em te dizer, leitor, mas nada dura o tempo eterno. Não se deve perder muito tempo nas edificações infinitas, pois todas são como os castelos de areia na praia de Copacabana; o ofício da vida é o desaparecimento.
              Assim foi. Íamos pela vida como duas almas completas, a confiança de um se via no amor do outro; mais dedicada definição não haveria que dizer-nos amor perfeito. Vivi para Cecília, Cecília viveu para mim e nossos filhos durante 12 anos completos. Quando de um gesto quase barroco, era uma manhã de domingo, ela disse-me:
- Teodoro, quero o divórcio. Vou morar com o Amadeus.
- Quê?
- Vou morar com o Amadeus...
- O motorista?
             Amadeus, o motorista, era músico amador; fingia tocar os concertos de Brandenburgo para impressionar Cecília, pobre coitada, qual cresceu ouvindo ordinárias notas de samba da XV de Novembro e se encantou pelo cravo temperado que ouvia do quartinho dos fundos da casa, atrás do jardim e de uma árvore pequena.
              Dizia-se que o amor não faz mover o mundo, mas vale a viagem valer a pena. Não sei. Não matei nem um, nem outro. Passou-se o tempo de árvore crescida que dá frutos. Os filhos cresceram, e foram embora; as músicas de Bach ficaram. Não percebi que a mudança foi natural; melodias numerosas, trompas de caça, violino, fagote, violoncelo, baixo contínuo, sinfonia cantata, orquestração excelente. Tudo é música, como entendeu bem a dona leitora. Não te pegue das harmonias eternas, meu amigo leitor. Há árias menos graves.

*Ricardo Novais



sábado, 5 de maio de 2012

O livro pirata


Quando falamos em produtos piratas imaginamos calçadas cheias de banquinhas de camelôs recheadas de CDs, DVDs, produtos eletrônicos e roupas fabricadas de forma ilegal. No caso do livro, dificilmente (eu diria mesmo impossível) alguém verá uma banquinha com um sujeito anunciando a venda de um calhamaço. Mas há livros piratas! São os downloads ilegais, livros baixados de links não autorizados. O pen drive criou uma nova forma de livro de bolso.
Um dos motivos para a pirataria de livros é o preço. Os livros mais baixados são caros, são livros técnicos, de informática e best-sellers.  Outro motivo é o fato do e-book ainda ser uma raridade no país. Para cada cem livros físicos vendidos, vende apenas um digital. Para efeito de comparação, nos Estados Unidos a relação é de cem livros físicos para 105 e-books. 
Apesar da preocupação das editoras, que em 2011 conseguiram tirar cerca de 48 mil links não autorizados que fazia cópias de livros, há autores que até incentivam a pirataria dos seus livros, como Paulo Coelho, que vê na prática uma oportunidade de ser cada vez mais lido. Outros autores utilizam outra estratégia para combater a pirataria: o preço simbólico. Há autores que cobram U$ 0,99 a cópia. É uma saída inteligente, já que a realidade mostra que é impossível acabar com a pirataria. O jeito é criar uma concorrência à altura.  

sexta-feira, 4 de maio de 2012

O fim do mundo 2


O ser humano tem a mania tenebrosa de prever o fim do mundo. Talvez resida aí certo complexo de inferioridade ao não conseguir conceber a infinitude do tempo diante da brevidade da nossa existência. Sem contar que as profecias sobre o fim são ambíguas, já que elas sempre trazem consigo a ideia de que o fim não é o fim, sempre haverá uma recompensa ao sofrimento após a destruição do mundo. Ou seja, a relação do homem com o fim do mundo é sadomasoquista: tem que haver sofrimento para se chegar ao prazer. Quando se fala do fim do mundo, logo nos lembramos do Apocalipse, o capítulo mais tenebroso da Bíblia. Mas esse delírio começa bem antes.
Há mais de três mil anos, os hindus já criavam profecias pra o fim do mundo. Para eles, a cada quatro bilhões de anos, que equivale a um dia para o deus Brahma, o mundo se acaba. Isso por que ao final de cada dia (nossos quatro bilhões de anos) Brahma fecha os olhos para dormir. Desconfio que Brahma esteja sofrendo de insônia crônica. Cerca de 2.500 anos atrás, um sujeito chamado Zoroastro criou, na Pérsia (atual Irã) uma religião monoteísta que pregava que, num futuro indeterminado, Ahura Mazda (deus) enviaria à Terra seu último profeta, Shoasyanti. Quando isso acontecesse, o mundo seria coberto por um mar de lava e metal que todos teriam que atravessar descalços. Os puros nada sentiriam, naturalmente. Já os ímpios... Coitadas das solas dos meus pés.  
Depois deles os cristãos, os muçulmanos, os incas e todos os povos criaram suas profecias para a destruição do mundo. Sem falar os lunáticos de menor porte, como o pastor americano Harold Camping, líder do grupo cristão “Family Radio”, que previu o fim do mundo para as 20 horas do dia 21 de maio do ano passado. Claro que a sua profecia não se realizou. Não totalmente: logo depois ele teve um AVC e quase morreu. Pelo menos para ele, o mundo quase acabou. Esperemos 2012...

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Os mistérios do vaticano


Nem Dan Brown, autor de tramas que envolvem os mistérios do Vaticano, ousaria criar um enredo tão macabro. O que estaria fazendo os restos mortais de um notório mafioso enterrado numa cripta subterrânea do vaticano? Especula-se que a viúva de Enrico De Pedis (na foto, a esquerda), chefe do grupo mafioso Banda de Magliana e assassinado a tiros em 1990, teria pago um bilhão de liras (antiga moeda italiana), algo em torno de R$ 1,245 milhão, para que o marido fosse enterrado na Basílica de São Apolinário ao lado de papas e cardeais.
O que parece ser um simples caso de suborno, na realidade esconde tramas muito mais nefastas: o atentado contra a vida do papa João Paulo II; a prisão de Mahmet Ali Agca, o terrorista que tentou matar o papa em 1981; grupos de extrema direita; o “banqueiro de Deus” Roberto Calvi; a máfia italiana e o misterioso desaparecimento de uma jovem de 15 anos em 1983. Mas o que o desaparecimento de uma jovem tem a ver com o sepultamento de um gangster em um solo considerado sagrado para os católicos?
Tudo começou em 2005 quando, num telefonema anônimo para um programa de televisão, um homem afirmava que Emanuela Orlandi (na foto, a direita), filha de um alto funcionário do Banco do Vaticano e desaparecida em 1983, estaria enterrada na mesma cripta de De Pedis. A polícia descobriu que o homem que fez a ligação anônima é filho de um membro da gangue que De Pedis chefiava. Há especulações de que o pai de Emanuela tinha provas ligando o Banco do Vaticano ao crime organizado e o seu sequestro era uma forma de silenciá-lo. O sequestro teria sido realizado por De Pedis a mando do cardeal Paul Marcinkus, que era chefe do Banco do Vaticano e que faleceu há quatro anos. 
E onde entra Mahmet Ali Agca, os grupos de extrema direita e Roberto Calvi, o “banqueiro de Deus”? Outras teorias afirmam que a jovem teria sido entregue a grupos de extrema direita da Turquia, que a trocaria pelo terrorista Ali Agca.  Calvi era o todo poderoso chefe do Banco Ambrosiano, maior parceiro do Banco do Vaticano e esteve no meio do furacão que levou à falência as duas instituições financeiras. Quando o escândalo envolvendo os dois bancos veio à tona, Calvi se matou.  Dan Brown deve está boquiaberto...

quarta-feira, 2 de maio de 2012

O rei de Keto – Antonio Olinto


Depois de ter criado Mariana em A casa da água, primeiro volume da trilogia Alma da África, Antonio Olinto dá à luz a outro mulher forte em O rei de Keto, volume 2 da mesma trilogia: Abionam, uma andarilha infatigável que ganha a vida de mercado em mercado. A partir de um provérbio ioruba, “Mãe é ouro, pai é vidro”, Olinto retrata uma sociedade predominantemente feminina.
Abionam, amiga da velha Mariana do primeiro volume e pertencente a uma das cinco famílias reais de Keto, sonha em ter um filho que se tornará rei. Como o primeiro, Adeniran, morreu, ela vive planejando em ter um novo Adeniram. Enquanto isso, lembra sua existência sofrida e as viagens que fez com a mãe. O livro trás aspectos das crenças dos iorubas, contados pelo adivinho Fatogum, e aspectos universais, como a ganância pelo poder, motivo pelo qual Abionam acredita que o filho tenha sido morto pelo tio.
Lançado originalmente em 1980, traz no seu final um relato de grande beleza literária, quando Abionam se deixa possuir pelo homem que deixará a semente de Adeniram, o futuro rei de Keto, em baixo de um baobá, o mesmo lugar em que nasceu e enterrou o primeiro filho. Um livro fundamental para quem deseja desvendar a cultura africana.