quinta-feira, 29 de abril de 2010

Casal perfeito

Tales estava casado com Nildinha há três anos. Eram apaixonadíssimos. Todos os meses, no dia 23 comemoravam o aniversário da relação, que começara nesse dia de agosto cinco anos antes.
Trocavam presentes e iam comer uma pizza num mês, no outro iam ao cinema, às vezes iam a um motel, como naquele dia.
- Te amo, meu amor – declarara Tales depois de fazer amor com Nildinha.
- Também te amo, minha vida – devolvera Nildinha mais do que apaixonada.
- Mas tá na hora de irmos. Ainda temos que passar na casa da sua mãe. Lembra?
Nildinha fez um muxoxo, mas foi obrigada a concordar. Tinham que ir.
Quando já estavam dentro do carro, manobrando para sair do motel, Tales avista um carro que pareceu-lhe familiar. Era o carro do Gustavo, colega de trabalho.
Conhecendo o amigo, Tales achava impossível que ele estivesse com a sua mulher no motel. Muito provavelmente estaria com um das suas inúmeras amantes ocasionais. Por causa disso, Nildinha não simpatizava nem um pouco com o Gustavo. Tales resolveu aprontar uma com o amigo.
- Nildinha, vou ver se o carro tá aberto e vou tirar o som.
- Para com isso, Tales!! Brincadeira sem graça – Reprovou Nildinha, que por não gostar de Gustavo, não queria esse tipo de intimidade do seu marido com o amigo.
- É só uma brincadeirinha, amanhã eu devolvo.
Pé ante pé, Tales se aproximou da garagem do quarto onde o carro de Gustavo estava estacionado e, para sua surpresa, o carro estava aberto. Tales desconectou os fios do som e o retirou.
Iria dar um grande susto no amigo!

* * *

Gustavo era o que podíamos chamar de fanfarrão. Casado com a Patrícia, tinha uma amante em cada esquina. E adora contar aos amigos as suas aventuras amorosas.
As esposas dos amigos não gostavam dele e o criticavam por isso, uma vez que a Patrícia era uma esposa exemplar, que vivia para o marido e para os dois filhos do casal. Uma verdadeira Amélia. Nada se sabia que a desabonasse.
Sem contar a beleza. Morena alta, de longos cabelos negros, olhinhos amendoados e corpo escultural, chamava a atenção dos homens por onde passava, recebia elogios até mesmo dos amigos do Gustavo. Claro que às escondidas.
E Gustavo, apesar das peripécias amorosas, não escondia o orgulho que sentia ao andar ao lado da Patrícia. Sendo ele mais baixo poucos centímetros do ela e não tendo a beleza que ela tinha e ainda assim tendo amantes, o gozador não perdia uma oportunidade de tirar sarro com os colegas:
- Pior do que ser infiel é ser fiel a mulher feia! – Tripudiava Gustavo, numa referência a Glauco, colega de trabalho, cuja esposa entrara na fila de feiúra algumas dúzias de vezes. Essas brincadeiras provocavam alguns risinhos constrangidos nos colegas.
Mas naquele dia Gustavo chegara com aquela ruga de preocupação na testa. Mesmo percebendo a ruga, Tales já se preparava para soltar uma piada com o colega sobre o som roubado na véspera:
- E aí, Gustavão...- Começou Tales.
- Cara, você não acredita... - falou Gustavo.
- o que foi, meu? – Perguntou Tales, preocupado com a cara que o Gustavo fazia e com aquela ruga enorme entre os olhos.
- Tomei um prejuízo ontem.
Tales se contorcia de rir por dentro, esperando o momento certo pra fazer a brincadeira.
- A patrícia foi estudar ontem na casa de uma colega de faculdade e roubaram o som do carro.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

De Gutemberg a jobs

No início do mês, a Apple lançou, nos Estados Unidos, o iPad, um misto de notebook, leitor de livros digitais e terminal móvel de acesso à internet. Estima-se que 1 milhão de unidades serão vendidas até junho. De imediato, perguntou-se se isso representaria o fim do livro impresso. Desde a invenção da prensa móvel, no século XV, pelo alemão Johannes Gutemberg(ou até mesmo antes dele, uma vez que o livro já existia, só não era impresso), que o livro de papel enfrenta desafios e, no entanto, não se extinguiu. No século XIX, surge a revista, cujo mercado se expande violentamente no século XX. Ainda no final do século XIX, surge o rádio, que também se expande no século XX. É também no século XIX que surge o cinema e que também se expande no século XX. E o que falar da internet? Muitos decretaram a morte do livro de papel! Outros chegaram a encomendar a missa de 7º dia.
Acredito firmemente que, apesar do lançamento do iPad, não será dessa vez. Esse representará mais um desafio ao livro de papel. Juergen Boos, diretor da Feira de Frankfurt, o maior e mais importante evento do mercado mundial de livros, afirmou que “há uma forte conexão física entre o leitor e o livro”. Concordo plenamente com ele!! A relação entre o amante da tecnologia e o produto é efêmera, fria, interesseira, pragmática. O individuo acessa a internet em busca de uma informação rápida que atenda a seus interesses mais imediatos. Alcançado o objetivo, ele de imediato desconecta-se. É uma relação sem cheiro, sem tato, sem ritual.
A relação entre o leitor e o livro é completamente diferente. É ritualística! O bibliófilo entra numa livraria ou numa biblioteca como quem entra num templo. O contato com o livro é mágico, envolve três sentidos: olfato, tato e visão. Não basta apenas ler! Tem que sentir o cheiro do livro. Folheá-lo página a página, como se fosse um baralho, provocando aquele ventinho que trás o cheiro de papel nariz à dentro. O amante do livro não compra um livro apenas para ler. Ter o livro em sua estante, mesmo sem nunca lê-lo é o suficiente. Ter uma obra rara, autografada pelo próprio autor já é um sonho, alcançado por poucos. O outro motivo pelo qual o livro não sucumbirá diante das novas tecnologias é mais prosaico: livro vende. Prova disso são os novos títulos lançados diariamente pelas editoras. Prosaico ou nobre, o importante é que não faltam motivos para que o livro continue o mesmo, com ou sem tecnologia.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

O mérito

O ex-ministro do governo FHC e atual secretário da Educação do estado de São Paulo, o economista Paulo Renato Souza, concebeu e a Assembléia Legislativa aprovou, um plano de carreira para os professores inteiramente baseado na meritocracia. O ex-governador de Minas Gerais e candidato ao senado Aécio Neves, estabeleceu metas para todos os servidores, que receberão uma remuneração extra caso essas metas sejam alcançadas. Apesar da sutil diferença, em ambos os casos impera o sistema meritocrático. Ninguém com um mínimo de sensatez (que parece que está faltando aos sindicatos) será contra a meritocracia no serviço público, mesmo por que todos ganham, do servidor á população. No entanto, a meu ver, existe uma discussão que antecede a questão da meritocracia, que é a formação do profissional. É impossível falar em avaliação ou mérito sem antes falarmos sobre a formação do profissional que será avaliado e, se merecer, terá vantagens na carreira. Vejamos o caso a educação.
Muito me preocupa a qualidade dos professores no Brasil. Muitos dos profissionais que hoje estão em sala de aula, ali estão menos por vocação do que por falta de opção. Muitos candidatos prestam vestibular para cursos da área de educação por medo de não serem aprovados em outros cursos. Vão ficando por ali e, quando menos se espera, estão em sala de aula. Em outras palavras, o aluno medíocre do ensino médio se torna, por falta de opção, o professor despreparado que irá ensinar a jovens que serão igualmente medíocres e, muito provavelmente, entrarão num curso de educação por que não conseguem algo melhor para fazer. Isso vira um circulo vicioso. Portanto, a primeira coisa a ser feita seria tornar os cursos da área de educação atraente para bons alunos do ensino médio. Como fazer isso? Pagando bons salários, melhorando as condições de trabalho e dando possibilidades de ascensão dentro da profissão.
Infelizmente a tendência aponta para o lado oposto. A muito custo, a categoria conseguiu um piso nacional miserável de pouco mais de mil reais, que levou três anos para entrar em vigor (esmola pré-datada) e que alguns governadores brigam na justiça para não pagar (enquanto no Judiciário algumas categorias brigam para ganhar além do teto de R$ 24 mil). As condições de trabalho nas escolas são aviltantes, com a violência imperando, seja contra professores ou entre os alunos, sem contar as salas lotadas e quentes. Como aprender ou ensinar em tal ambiente? Prefeituras e estados oferecem cursos de pós-graduação grátis para capacitar os educadores. Ebaaa! Mas são aos sábados e domingos. É querer demais sair de sala de aula para estudar. Observo a cada dia que aumenta o número de professores que acusam problemas de saúde, os mais freqüentes são a depressão, a síndrome do pânico e problemas na garganta. Infelizmente, quem está na escola está só!! A legislação amarra as ações da escola na relação com o aluno, o poder público tem tratado o profissional da educação como uma escória e a sociedade, a despeito dos discursos sobre a importância da educação na vida de todos, na prática não acompanha o desempenho dos seus filhos em sala. Dessa forma não há mérito mesmo.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

O escândalo nosso de cada dia

Desconfie de alguém excessivamente religioso. Não interessa qual a religião. Qualquer pessoa que demonstre uma religiosidade exacerbada não é digna de confiança. Toda generalização corre o risco de cometer injustiças. Mas mesmo assim, não confie. Se você conhece alguém que coloca Deus em cada frase e vomita passagens bíblicas tenha certeza que é autoafirmação ou enganação. Jamais convicção! A minha desconfiança se baseia na discrepância entre o discurso e a prática dessas pessoas, que condenam em público o que fazem em âmbito privado, condenam nos outros o que eles mesmos fazem às escondidas. A religiosidade é algo íntimo, que se manifesta no âmbito privado, sem necessidade de mostrar, a qualquer custo, o quanto se é religioso aos demais.
Os escândalos recentes na Igreja Católica não serão os primeiros nem os últimos. A gravidade dessa vez é que está chegando perigosamente perto da figura do Sumo Pontífice. O Papa, que já pediu desculpas aos americanos e aos irlandeses (dizem as más línguas, que os próximos serão os marcianos) pelos abusos praticados por membros da Igreja nesses países, está vendo o seu nome se aproximar do abismo. Apesar da retórica expiatória de Ratzinger, hoje sabe-se que nos anos 70, quando era arcebispo de Munique, e nos anos 90, já prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, protegeu padres pedófilos ou, na pior das hipóteses, se omitiu diante de casos de pedofilia. Entre 2001 e 2010, a Congregação para a Doutrina da Fé recebeu 3.000 denúncias de abusos sexuais contra padres. Apenas 10% culminaram na expulsão do padre dos quadros da Igreja.
Todo esse escândalo deixa os evangélicos brasileiros felizes como urubu na carniça. A Rede Record fez questão de mostrar uma extensa reportagem, no último domingo, no programa Domingo Espetacular, detalhando caso por caso. É o sujo falando do mal lavado! A Igreja Universal, controladora da Rede Record, coleciona escândalos sexuais, financeiros, políticos, entre outros. Outras denominações religiosas vão no mesmo caminho. Uma dissidência da Universal, a Igreja Mundial do Poder de Deus, liderada por um ex comandado de Edir Macêdo, Valdemiro Santiago de Oliveira, coleciona casos escabrosos de milagres e até, pasmem, ressurreição. Pois é, o cara de pau afirma que já ressuscitou um homem. Mas ele é um cara de pau modesto. Afirma que o falecido só voltou do além por que era um homem de fé. Milagre mesmo é se conseguirmos nos livrar desse povo...