sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Do vício, do prazer...

Uma mãe denuncia a escola em que sua filha estuda por tocar “música demoníaca” durante a apresentação de um número de dança. A tão mal afamada música é Pererê, de Ivete Sangalo, uma música bem chinfrim que é difícil até mesmo para o capeta assumir sua autoria. Mas o tal Pererê citado na música até que é bem consciente das suas obrigações, como relatado no trecho a seguir: “Pererê não gosta de fumar cigarro!/ Pererê não bebe quando sai de carro!/ Pererê não faz amor sem camisinha!”. E a tal “mãe zelosa” ainda diz que a música pertence ao capeta! Ou o capeta é um sujeito mal afamado ou o deus dela é muito exigente. Ou as duas coisas! Não é necessário dizer que essa genitora é uma mulher religiosa....
Custa-me entender como alguém pode acreditar em algo absolutamente abstrato. E pior: abrir mão dos prazeres da vida em nome dessa abstração. Pior ainda: apontar o dedo, recriminar, criticar e, em casos extremos, matar em nome do que essa abstração supostamente considera a maneira correta de viver. Relegar o prazer ao campo sombrio do pecado é abrir mão da própria vida. O vício e o prazer fazem parte da natureza humana, privá-la disso é criar um monstro deformado pela perfeição. É tornar a existência humana mecânica e insípida. Qual o sentido em viver num mundo que demoniza o prazer e o vício e onde as melhores coisas que podemos experimentar são estigmatizadas e consideradas pecados?
Aos treze anos me descobri ateu. Desde então acredito que fé e necessidade são termos análogos. Não sinto a necessidade de me apegar a algo abstrato e intangível. No dia que sentir essa necessidade me prostrarei pateticamente diante de um ídolo qualquer. Ter fé em um deus é alienar-se da própria liberdade e imputar a algo transcendente um motivo para viver. É, em nome dessa transcendência, abrir mão do que a vida tem de melhor e viver estoicamente; é creditar a esse deus as suas boas ações e não como consequência intrínseca a sua conduta; é responsabilizar esse mesmo deus pelo que acontece ao seu redor, e não como consequência de atos meramente humanos.
Cabe exclusivamente a cada um de nós dá um sentido a nossa existência. Como a maioria das pessoas não tem capacidade intelectual de fazer isso; como para essas pessoas é impossível superar o caráter contingente da falta de sentido para sua existência, elas inventam deus. Se deus não existe, somente nós podemos decidir, sozinhos, o melhor caminho que determinará nossa vida e nossa essência. Mas o medo e a insegurança, inerentes à maioria dos humanos, faz com que seja mais seguro que os outros tomem essas decisões. Nem que esse “outro” seja uma abstração...

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