quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Cabeça de papel – Paulo Francis

Quando publicou Cabeça de papel em 1977, o jornalista Paulo Francis tinha a pretensão que fosse o primeiro volume de uma trilogia que esmiuçasse a elite intelectual brasileira nos anos imediatamente antes e depois do golpe militar de 64, uma espécie de acerto de contas do autor com seu passado, quando os intelectuais da sua geração acreditavam poder mudar o país. Como admitira em 1994, tinha perdido “muito tempo com a política” e queria expor suas ideias (sempre carregadas de polêmicas) através desses três romances.
“(Ingmar) Bergman está inventando que a classe média pensa, sente, que é gente. Só se for na Suécia, mas lá não tem negro, mulato, mestiço, índio, mineiro, nordestino, paulista (...). Aqui não dá pé”.    
Hugo Mann (personagem-narrador e alter ego de Francis) é um crítico de cinema desiludido, descrente da esquerda partidária. Paulo Hesse é o ex-esquerdista que foi “cooptado pelo sistema”, como se dizia na época. Há quem diga que esses dois personagens lutavam dentro das incertezas do próprio Francis. Com uma narrativa meio confusa e anárquica, Hugo e Paulo vão expondo seus pontos de vista sobre cinema, politica e comportamento, um por convicção e o outro por conveniência.
“O mau gosto é filho inabortável e incorrigível da riqueza nova”.
Paulo Francis “Carregou nas tintas” de tal forma que os editores tiveram que cortar parte do texto para que ele ficasse menos intelectual. Não resolveu muito! O livro se equilibra mal entre os debates de ideias, jorradas da boca dos personagens como uma metralhadora, e a sequência narrativa. Resultado: o encadeamento entre as cenas é frágil e, muitas vezes, confuso. Confuso também são os monólogos do personagem-narrador que pouco servem à narrativa.
Um casamento que resiste, ou qualquer relação constante entre pessoas, precisa do estímulo das crises falsas, que, falsas, são fáceis de resolver”.

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