quinta-feira, 30 de julho de 2015

Getúlio – Lira Neto

O projeto era comercialmente ousado: escrever, em três volumes, uma biografia de Getúlio Vargas, o presidente que mais tempo ocupou o cargo e que, até hoje, desperta paixões. O primeiro volume, e o mais difícil de escrever, cobre o período desde o nascimento de Getúlio, em 1882, até sua chegada ao poder, em 1930. Difícil porque cobre um período pouco conhecido do político, suas biografias mais conhecidas se preocupam com o período em que ele já milita na política rio-grandense. O que se vê é uma família encalacrada em escândalos e sempre se valendo da proximidade com os poderosos para se safar de eventuais punições.
Quando ainda estudantes, Getúlio e seus irmãos, Viriato e Protásio, se envolveram no caso nebuloso do assassinato do estudante paulista da família Almeida Prado. De imediato, seu pai, um estancieiro poderoso do Rio Grande do Sul, tratou de providenciar a fuga do irmão mais velho (Viriato), maio envolvido no caso, e retirou os outros dois de Minas Gerais e tratou de, através de influências políticas, abafar o escândalo. Viriato viria a se envolver em outros crimes, tratados da mesma forma pelo pai e pelo já advogado Getúlio Dorneles Vargas. Um período difícil de cobrir, pois os documentos são escassos, pouco conhecidos e estavam espalhados em várias partes do Brasil.
O segundo volume cobre a primeira fase do governo Getúlio, de 1930 a 1945. Chegando ao poder através de um levante, o livro deixa a impressão que Getúlio mais foi levado pelos acontecimentos do que liderou o movimento. Vacilante, nos documentos escritos deixados por ele, é possível antever o que aconteceria em 1954. Getúlio já demonstrava, em 1930, que tinha uma propensão ao suicídio. Outro traço marcante do politico que é possível vislumbrar nesse volume é a sua astúcia e jogo de cintura para solucionar os problemas dentro do “balaio de gato” que era o grupo que o levou ao poder.
O terceiro e último volume cobre desde a sua deposição, em 1945, até o suicídio, em 1954. Nesse volume é possível ver o tamanho da liderança que Getúlio representava. Mesmo apeado do poder sob uma chuva de denúncias, consegue se eleger deputado e senador por vários estados da federação (a legislação eleitoral da época permitia) e, mesmo não cumprindo seu mandato e se refugiando na sua estância no sul, consegue se eleger presidente da República. Mas também é possível ver novamente um líder vacilante. Só decide se candidatar a presidente depois de muita pressão dos seus correligionários e na última hora. Difícil é saber se ele estava em dúvida sobre a viabilidade da candidatura ou se era uma “jogada” de mestre.
A escrita do jornalista cearense Lira Neto é fluida e gostosa, não é necessário ser do ramo para entender os meandros dos aspectos históricos narrados nos três volumes. Seus textos, mesmo sendo de história, mais parecem romances. No entanto, essa obra não fugiu das polêmicas. Outros autores, entre eles Juremir Machado, autor de um romance histórico sobre Getúlio, afirma que documentos tratados como “inéditos”, já constam de outros livros há vários anos. Entre esses documentos está o discurso da formatura em direito, em 1907, quando Getúlio faz severas críticas à mulher e ao cristianismo e sua moral sexual, revelando seu ateísmo que o acompanharia por toda a vida.
Polêmicas a parte, é um livro que desnuda um dos maiores políticos da história do Brasil, um líder incontestável que, no início da carreira assumiu posições que poderiam ter enterrado a carreira política de muitos, mas não de um mito.

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