segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O perdão que nunca veio


- Você é um canalha! - Isolda gritou com todas as forças. Andava na cozinha como uma leoa numa jaula.
- Mas eu não fiz nada. – suplicava Luiz, praticamente encolhido numa das cadeiras da mesa.
- Você sabe que fez. – agora falava mais baixo, mas com o dedo indicador voltado apontado para Luiz. – Eu não sei exatamente o que você fez, mas você sabe.
Luiz olhava perplexo para Isolda enquanto ela abria a geladeira, pegava uma lata de cerveja e tomava um gole longo.
- Você está bêbada?
- Se é possível ficar bêbada com um gole de cerveja, eu estou. – falou Isolda com sarcasmo.
- Você não está falando coisa com coisa.
- Eu sou a bêbada, a louca, a histérica! – voltou a gritar Isolda.
- Eu não estou dizendo isso...
- E está dizendo o que? – interrompeu Isolda aos gritos.
- Nada. – Falou Luiz acabrunhado.
Luiz e Isolda estavam casados há cinco anos e não tinham filhos. Dividiam a casa e o aluguel com Isabel, irmã de Isolda e proprietária de um corpo de tirar o fôlego, razão para grande parte do ciúme da irmã.
- Mas eu tenho muito que falar. – Isolda toma outro longo gole de cerveja e praticamente esvazia a lata. 
Luiz tinha trinta e um anos, trabalhava como atendente numa farmácia e há muito tempo desistira de estudar, parando no ensino médio. Isolda tinha vinte e nove anos, trabalhava como secretária de um dentista bonitão durante o dia, razão de desconfianças de Luiz e fazia pedagogia numa faculdade particular à noite.
 - Faço sacrifícios para que você possa estudar, meu amor. – costumava dizer Luiz para justificar a sua preguiça em estudar, quando era cobrado pela esposa.
- Então pare de fazer sacrifícios e vá estudar. – ela sempre retrucava.
Agora estavam ambos na cozinha de casa, em mais uma discussão por causa dos ciúmes de Isolda. Isabel estava na faculdade de ciências contábeis que fazia no período noturno. 
Luiz estava de cabeça baixa, fazendo bolinhas com migalhas de pão. 
- Você nem se digna a pedir perdão pelo que faz! – falou indignada Isolda.
- Mas o que eu fiz? – Luiz larga as migalhas e põe as duas mãos no peito, em súplica.
- Você sabe! – grita ela, apontando, mais uma vez, o dedo na direção de Luiz. - Deve-se pedir perdão até pelo que não fez.  
- Você está se referindo ao episódio do banheiro? 
- Já tá começando a aparecer! Que episódio do banheiro? 
Luiz observava com aflição as veias da testa e do pescoço de Isolda, que estavam a ponto de explodir.
- Mas foi sem querer, Isinha. – apressou-se em dizer.
- Isinha um cacete! Sem querer um cacete também! Fala logo! E você está errando de pessoa. Isinha não sou eu!
- Eu ia passando em frente ao banheiro quando vi, pela porta entreaberta a sua irmã no espelho. E através do espelho eu vi o seio dela. Mas foi sem querer! – apressou-se em dizer e pensou: “E que peitinhos”.
Isolda estava vermelha. Parecia que ia explodir.
- E o que você fez?
- Eu não fiz nada... – apressou-se em dizer Luiz.
- Esse é o seu problema, seu idiota.  – interrompeu Isolda – você nunca faz nada.
- Não entendi.
- Esse é seu outro problema, seu imbecil. Você nunca entende nada!
Luiz estava de boca aberta, sem saber o que dizer.
- Você lembra no churrasco de aniversário do Amílcar, quando a mulher dele, a Carla, deu em cima de você depois que estava bêbada?
- Mas eu não fiz nada! - Apressou-se em dizer, mais uma vez, Luiz.
- Esse é seu problema, Luiz. – Isolda parecia resignada. Dirigiu-se à geladeira. Ao abrir a porta, virou-se para Luiz.
- Você nunca faz nada.
Abriu mais uma latinha de cerveja e deu um grande gole.  

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