quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Fred

Todos chegavam à casa de Frederico pra visitá-lo. Era a primeira vez que isso acontecia. Frederico, que todos chamavam de Fred, recebera esse nome numa homenagem que a mãe fizera a um vizinho. A sua alegação para a homenagem era que ela achava que o vizinho ainda seria um escritor famoso. Depois, descobriu-se que eram amantes e que Fred era, na verdade filho de Frederico, o vizinho. Por causa disso, o marido da sua mãe abandonara a casa e o vizinho se mudara com toda a sua família para evitar o escândalo. Sua mãe perdera o marido e o amante. Restara-lhe Fred. Na escola teve um desempenho mediano. Não era dos piores, mas estava longe de estar entre os melhores. Terminou o ensino médio sem nunca ter namorado, nem mesmo beijado alguém, o que era motivo para gozações dos poucos colegas com quem se relacionava. Sempre fora muito introvertido. Ainda assim, a mãe acreditava que Fred seria alguém famoso seja escritor, ator, cineasta ou qualquer outra coisa.
Tentou fazer vários cursos e não concluiu nenhum. Psicologia, sociologia, direito, nada lhe interessou. Resolveu fazer um curso de cinema. A sua carreira de cineasta teve vida curta. Gravou apenas um filme homoerótico, intitulado “Me atirei no pau do gato”, que fez um relativo sucesso entre alguns homossexuais que freqüentavam umas saunas de reputação duvidosa numa área da cidade de reputação mais duvidosa ainda. Aos 25 anos perdeu a virgindade com uma prostituta que resolveu fazer-lhe a caridade, já que Fred não tinha dinheiro para pagar o programa. Antes de completar 30 anos, escreveu um livro de poemas, intitulado “Poemas ao vento” que, ao que parece, o vento levou, pois ninguém leu por que não encontrou quem o publicasse. O melhor comentário que recebeu de editores a quem recorreu foi que “se fizesse algumas mudanças de rumo, seria um poeta promissor”. Nada foi feito e ele não se tornou poeta. Quando completou 35 anos, a sua mãe, já idosa, morreu sem vê-lo famoso. A sua família resumia-se, a partir de agora, a ele mesmo.
Depois dos 40 anos, resolveu procurar empregos mais convencionais. Conseguiu um como vendedor numa loja de sapatos. Dois meses depois tinha vendido apenas quatro pares. Percebeu, e o seu patrão também, que essa não era a sua área de atuação. Continuava vivendo sozinho na mesma casa onde nascera, na companhia da gata Bruna Lombardi. Não tinha amigos nem família, apenas a Bruna Lombardi. Não conversava com os vizinhos. Uma vez por semana, as sextas freqüentava uns bares de alta classe como guardador de carros e, mais tarde, uns bares de baixíssima classe, onde tomava uns tragos e conversava com alguns boêmios, que conhecia de passagem, sobre quem era mais cantor: Nelson Ned ou Altemar Dutra. Os outros dias eram tomados com leituras de livros refugados que conseguia num sebo, cujo dono se compadecia da sua situação. Chegou aos 60 com a convicção de que a vida fora-lhe um túmulo. Já não saía mais de casa para conversar com os boêmios nem para buscar os livros refugados do sebo. Agora, alguns vizinhos, alguns boêmios e o dono do sebo chegavam a sua casa para visitá-lo pela primeira e última vez. O enterro seria às 16.

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