O jornalista cearense Lira Neto consumiu dez anos para escrever Padre Cícero: poder, fé e guerra no sertão. O resultado é um livro com uma leitura agradável, um texto envolvente e uma reconstituição histórica primorosa. Em alguns momentos acredita-se que se está lendo um romance, tal a pormenorização dos diálogos. Como o autor conseguiu reconstituir tais diálogos com tanta minúcia? Lira Neto contou com o acervo da Cúria do Crato, que tem mais de 900 e cartas e com uma fonte valiosa do Vaticano, que ele não revela.
Toda a polêmica envolvendo Padre Cícero, então um jovem sacerdote, começa em 1889, quando, ao oferecer a comunhão à beata Maria de Araújo, viu a hóstia sangrar. Com a continuação do fenômeno, médicos foram chamados e não conseguiram explicar o que estava acontecendo. Daí para a população de Juazeiro considerar milagre foi um pulo. Apesar de não ser religioso, Lira Neto não nega de forma taxativa esses eventos: “Algo aconteceu ali”, afirma. Suspenso das atividades sacerdotais pela igreja, que não aceitava tais eventos como milagrosos, Cícero se volta para a política, demonstrando sua capacidade de reinvenção e revelando sua sagacidade na hora de fazer alianças.
Além de Cícero, um homem sagaz e inteligente na hora de fazer alianças, mas pouco culto, o livro nos traz outros personagens curiosos. O primeiro deles é a própria Maria Araújo, negra, analfabeta e protagonista do “milagre de Juazeiro”, foi obrigada a se exilar de Juazeiro por ordem da Igreja. Depois de Cícero, o personagem mais intrigante é floro Bartolomeu. Sempre ouvi no curso de história que esse homem misterioso, de quem não se sabia de onde veio nem que fim levou, era usado por Cícero como testa de ferro nos seus projetos políticos. O livro dá a entender que Cícero foi usado por Floro na sua ambição de ganhar dinheiro e conquistar poder com o carisma do sacerdote e sua suposta capacidade de realizar milagres. Uma grande obra tanto para ser lida como lazer quanto como fonte de pesquisa.
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