Tenho muitos conhecidos, mas com o Marcinho tenho uma identificação muito grande. Não me pergunte por que, pois somos quase o oposto um do outro. Ele é aquele cara que fala muita abobrinha, eu sou meio caladão. Ele bebe de segunda a segunda se não precisasse trabalhar, eu sou mais contido no quesito álcool. E a maior das diferenças: ele pega todas as mulheres (ou pelo menos diz que pega), eu namoro pouco, mas faço minhas estripulias de vez em quando.
- Lembra da fulana? Aquela gostosa que chegou na nossa mesa sábado passado? Peguei! Gata, né? – eu ouço isso sempre que me encontro com o Marcinho.
E o que mais detesto é que ele fica esperando a confirmação de que a gata com quem ele ficou é estonteante. É a mesma pergunta no final de cada frase: “É gata, né? Hein?” Na maioria das vezes é mesmo. Mas precisa ele ficar me torturando? Só por que eu não fico com uma ínfima quantia das mulheres que gostaria e ele fica ou, nunca custa nada repetir, diz que fica? Eu odeio esse “hein” dito incontáveis vezes até que eu confirme que realmente a garota é muito bonita.
Nos encontrávamos quase todos os finais de semana. Não vou repetir que ele sempre conta alguma aventura que teve no meio da semana com alguma mulher que nós vimos no final de semana anterior: É gata, né? Hein? Hein? Para meu deleito, às vezes ele fracassava nas suas conquistas. Mas ele não me contava, ficava sabendo por outras pessoas.
Mas quero deixar bem claro que não havia competição entre nós. Eu não tinha como competir com ele!
Mesmo com essa irritante capacidade de conquistar (que eu não tinha), eu me identificava com ele. Gostava de sair com ele para as farras. Falo sempre no passado por que já faz muito tempo que tudo isso aconteceu.
Num certo final de semana, Marcinho me chamou pra um churrasco na casa de um conhecido dele. Eu conhecia o dono da casa apenas de vista. Fomos.
Quando cheguei no churrasco, olhei todos e percebi que, a exceção do dono da casa, não conhecia ninguém. Mas me detive numa criaturinha de pele branca, cabelos longos e lisos. Devia ter uns 18 anos. Na época, eu tinha pouco mais do que isso.
- Quem é aquela ali de blusa branca? – perguntei ao Marcinho.
- Sei lá! – Respondeu-me e já entrou numa conversa com outra pessoa que estava na mesa conosco. Ele adorava fazer isso: não dá a mínima quando eu manifestava interesse por alguém. Quando isso acontecia com o cafajeste ele ficava naquele “hein, hein?” irritante.
Ela tinha uma criança no colo, que dormia. Devia ter entre seis e oito meses o bruguelo. A julgar pela pequena barriga que ela possuía, o filho deveria ser dela. A julgar pela mesma barriga, fruto do parto recente, deveria ter um corpo e tanto antes da gravidez.
Continuei a observá-la. Ao lado dela estava um senhor de cabelos grisalhos, visivelmente embriagado que ficava mexendo nas mãos da criança adormecida e encostando a cabeça no ombro da mãe .
Lá pelas tantas, eu já estava mais pra lá do que pra cá depois de muita cerveja. Como a maioria das pessoas já tinham ido, todos ficaram numa roda em torno de uma mesma mesa, inclusive a minha musa.
(vou abrir esse parêntese para dizer que, depois de algumas cervejas, eu facilmente encontro musas, por quem nutro um amor eterno até que o efeito da cerveja passe).
Voltando. O senhor de cabelos grisalhos continuava ao seu lado brincando com a criança (agora acordada). Percebi que a cadeira do outro lado estava vazia. Resolvi colocar em funcionamento meu dispositivo de conquista (uma decisão infeliz, descobri depois).
Sentei-me ao seu lado e lancei na sua direção um sorriso mal disfarçadamente desinteressado.
- Oi. Tudo bem? – falei.
Ela apenas sorriu um sorriso sem graça. O senhor, com sinais indisfarçáveis de embriaguez, continuava brincando com a criança. A cara dela era de quem estava incomodada. Ou seria eu, também meio embriagado, que queria que ela estivesse incomodada para que pudesse dá uma de herói?
Foi nessa hora que tomei outra decisão infeliz. Inclinei-me para bem perto dela e sussurrei:
- Esse senhor está incomodando você? Se você quiser eu posso colocar a minha cadeira entre ele e você. – falei com aquele ar de herói.
Ela me olhou como quem olha para um misto de imbecil e débil mental.
- Ele é meu sogro.
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