- Seu nome?
- M.
- Sua idade?
- 31 anos.
- Você confirma que entrou na
casa e roubou uma TV, Roupas e joias? – pergunta o delegado a M.
- Confirmo, sim senhor. – responde M., que
aparenta uma tranquilidade inabalável.
- O senhor não tem vergonha na
cara? – pergunta o delegado, inclinando-se e apoiando os cotovelos na mesa.
- Por que a pergunta, doutor?
- Você é um homem jovem, poderia
trabalhar e fica roubando.
- Mas eu trabalho, doutor! –
exclamou M. indignado - O senhor acha que é fácil ser ladrão? Não tenho horário
fixo de trabalho e não recebo hora-extra; às vezes trabalho a noite e não
recebo adicional noturno; corro o risco de ser preso ou flagrado pelo meu
cliente e ser espancado e o senhor ainda diz que isso não é trabalho.
- Você chamou a sua vítima de
cliente? – o delegado fazia uma cara de incredulidade.
- Sim. E um cliente especial! – respondeu M.
convicto - Afinal não é ele que me escolhe, mas eu que o escolho.
- Você é um grandessíssimo
cara-de-pau. O adicional que você merecia era uma boas porradas. – o delegado
encosta-se na cadeira.
- Não gosto de violência, doutor.
– M. aparentava muita autoridade ao falar. – Por princípio, sou um pacifista.
Fico indignado quando vocês da polícia ou clientes nos pegam e batem. Temos que
reivindicar melhores condições de trabalho.
- E a quem o senhor vai fazer
tais reivindicações? – agora o delegado voltava a usar da ironia.
- Em Brasília, ué! – o bom ladrão
fala como se isso fosse as mais óbvias das obviedades. – Afinal, lá estão
nossos companheiros de luta. Lá estamos bem representados! – M. parecia que ia
começar um discurso, mas foi interrompido pelo delegado.
- Seus amiguinhos...
- Não! – interrompeu o bom
ladrão. – A nossa relação é meramente política. Mesmo por que, filosoficamente
falando, discordo das suas práticas. Eu roubo no varejo! O que roubo não fará
falta ao meu cliente. Se fizer falta, não é tanto como faz para os clientes
deles, pois eles roubam no atacado.
- Estou chegando a conclusão que
cara-de-pau é pouco pra você! Você é mais do que isso: você é cara de laje!
- E o senhor um ingrato.
- Eu? Ingrato? – o delegado volta
a inclinar-se, apoiando os cotovelos na mesa.
- Claro!
- Por quê?
- Sou eu que lhe dou emprego,
doutor. Não apenas ao senhor, mas ao escrivão que aqui está fazendo suas
anotações, - nesse momento o escrivão olha o bom ladrão, com uma cara entre
incrédula e irônica - aos outros policiais, advogados, agentes penitenciários,
juízes, entre tantos outros.
Nesse momento, um repórter
policial entreabre a porta e escorrega a cabeça pela brecha aberta e olha para
a sala. M. sorri para o repórter e acena.
- Tá querendo ficar famoso, né,
pilantra? – o delegado é irônico.
- Claro, doutor! O meu sonho é
aparecer na televisão. – M. tinha um ar infantil, nada parecido com a cara que
fazia quando estava em contato com seus “clientes”.
- Bom – falou o delegado,
resignado – Pelo menos você daria um bom comediante.
- O senhor acha, doutor? –
Empolgou-se M.
- Não! Não acho. A sua cara de
pau não tem limites. Você não pensa nas suas vítimas? – o delegado já
demonstrava irritação.
- Penso, doutor, penso. Os meus clientes são
mais pecadores do que eu. Se não fossem, Deus não permitiria que fossem meus clientes...
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