“As leituras por conta própria desempenharam um papel mais importante
do que a instrução oficial, que foi pura perda de tempo e se encerrou quando
completei dezessete anos...”.
Para o jornalista e escritor
americano Truman Capote, tudo podia render uma boa história, desde que bem
observado. Ele deu mostras disso ao escrever A sangue frio, o relato de um brutal assassinato cometido num
vilarejo do extremo oeste do estado do Arkansas e que virou um marco da
literatura americana do século XX, publicado em 1966. Em Os cães ladram: pessoas públicas e lugares privados, uma coletânea
de relatos de viagens e rascunhos pessoais que cobre trinta anos da sua vida,
publicado em 1973, Truman Capote fala de diversos locais por onde passou e os
personagens que encontrou em cada um desses locais. A forma como as pessoas são
descritas parece ao leitor que se trata de personagens de um livro. Mas algumas
dessas pessoas eram (e ainda são) conhecidas do grande público, o que, em
alguns casos, trouxe problemas para o autor.
“A morte de um sonho não é menos triste do que a morte e, realmente,
exige de quem a sofre um lamento tão profundo quanto”.
A primeira parte do livro, Cor local, é composta por textos que o
autor chama de “impressões imaturas” e fizeram parte de um livro publicado em
1951. São os relatos das viagens que autor fez ao redor do mundo e pelos
Estados Unidos. No relato da viagem ao Haiti, onde esteve em 1948, Capote faz
um relato fantástico das festas populares do país. Em Veneza, no mesmo ano, a
paixão obsessiva de uma delinquente juvenil pela pessoa que acompanhava Capote
obriga os dois a saírem da cidade às pressas. No ano seguinte, o autor esteve
na ilha italiana de Ischia, onde teve a oportunidade de encontra, refugiados
numa ilha deserta, o que sobrou da família Mussolini. Num dos bairros boêmios
de Tânger, no Marrocos, chamado Petit Soko, Capote relatará a existência de
personagens, que ele chama de “celebridades” locais, como Estelle, a prostituta
que chegou de iate particular e foi abandonada no local; o dançarino Maumi; e
Lady Warbanks, que já teria sido, num passado não especificado, considerada a
mulher mais bonita de Londres.
“Não há gênero de intolerância mais desgastante do que o resultante da
condenação de características que você mesmo possui”.
Na segunda parte, intitulada As musas são ouvidas, nos dois primeiros
textos, Quando os canhões se calam e As musas são ouvidas, Capote relata a
viagem de um grupo de teatro americano á União Soviética, em dezembro de 1955,
em plena Guerra Fria, apresentando a ópera Porgy
and Bass. Entre relatos sobre a burocracia da viagem, como as dificuldades
para entrar na URSS, o financiamento dos atores pelo Partido Comunista, já que
o governo americano se recusou a patrocinar a viagem, Capote flana sobre tudo e
todos. Descreve as apreensões dos artistas sobre possíveis escutas instaladas
nos quartos dos hotéis, o cotidiano da companhia teatral numa terra estrangeira
e sobre peculiaridades de cada um, o que levou muitos dos citados a descrevê-lo
como um texto “apenas venenoso”.
“A arte e a verdade não são necessariamente compatíveis”.
Mas não foi assim que Marlon
Brando reagiu a O duque em seus domínios.
O relato que Capote fez da viagem ao Japão, em 1956, para entrevistar o
astro que estava no país granando o filme Saionara.
Foi pior! “Vou matar aquele cara!”, teria dito Brando quando soube do
texto. Não matou. Mas o perfil traçado do astro de Hollywood é de um sujeito
egocêntrico, entediado com o sucesso, mas que não consegue viver sem o clima de
bajulação que se criou em sua volta. No prefácio Os cães ladram, Capote fala que Brando pode até “ser um gênio, mas
não se distingue pela inteligência”. E volta a falar de Brando na terceira
parte do livro, Observações, quando
diz que nenhum outro ator levou “a falsidade intelectual a níveis tão altos de
pretensão risível”. Sobra também para Bob Dylan, “um sofisticado (?) vigarista
musical que finge ser um revolucionário sincero (?) e caipira piegas”. Nessa
parte do livro Capote dispara sua metralhadora verbal. Disse que Greta Garbo
era “uma mulher egoísta e cansativa” e que Elizabeth Taylor era essencialmente
inocente por achar que, ao dormir com um homem, teria que, necessariamente,
casar com ele. Capote acrescentou que ambas faziam do “encanto” uma profissão. André
Gide é descrito como um “escritor desprovido de imaginação”, Jean Cocteau, uma
figura “vigorosamente insincera” e Marilyn Monroe uma “divindade desleixada”,
conquistada pelo cartão de crédito, cuja carreira progrediu “do cabelo pintado
aos doze a um ou três maridos confiscados aos vinte”.
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