Quem gosta de animais de
estimação trata seus bichinhos como se fossem humanos, parte da família. É
comum bater papo com eles, contar-lhes confidências, segredos, desejar-lhes bom
dia. Quem ama um cão ou um gato sabe do que estou falando. Quem coleciona também
age do mesmo modo, independente do objeto colecionado, seja selo, figurinhas,
carrinhos, aviõezinhos, chaveiros ou qualquer outra coisa. Ou todo mundo faz
isso ou eu sou o único louco? Sendo um bibliomaníaco, é assim que ajo com meus
livros. Quando os compro, cheiro-os, folheio-os, olho-os da primeira a última
página e depois da última a primeira. Sem contar as conversas, trato-os como se
me ouvissem e respondessem às minhas indagações. O livro, para mim, tem vida
própria, sentimentos, opiniões.
Fiz todo esse preâmbulo para
contar uma história que me aconteceu durante as férias, no último mês de junho.
Como sempre faço quando viajo, fui à um sebo ver se encontrava algum livro
interessante. Para minha surpresa me deparei com um livro que já tinha me pertencido,
Reféns, de Stefan Heym, uma edição de
1943, mas com encadernação recente. Adquiri esse livro no dia 13 de abril de
1988 e li-o imediatamente. Conta a história de cidadãos tchecos que, em 1939,
são feitos reféns até que a Gestapo descubra o assassino de um oficial alemão. Esse
livro ficou comigo por mais de dezenove anos, quando fui obrigado a me desfazer
de muitos dos meus livros, vendendo-os nesse mesmo sebo.
Fiquei a imaginar o que pensou o
livro do seu antigo dono ao ser vendido por míseros vinténs: “Ingrato! Depois
que me usou, me descartou como se eu fosse nada. Percorreu cada linha das
minhas páginas e depois me trocou por alguns trocados.” Seis anos após a
separação, eis que me deparo com o mesmo livro, do mesmo jeito, sem rasuras,
sem riscos. Fico a imaginar a sua felicidade, sorriso estampado na capa: “Eu
sabia que você voltaria! Nunca perdi a esperança de voltar pra casa!” Pois é,
voltou...
Ele jamais entenderá as razões
por que o vendi nem o que senti ao fazer isso. Não podia manter caixas de
livros na casa dos meus pais sem que eu estivesse ainda morando lá. Muito menos
tinha condições de trazê-las para a nova casa, em outra cidade distante. Livros
gostam de ser manuseados, folheados e, principalmente, lidos. Fiquei,
insanamente, a imaginar a tristeza desse livro durante seis longos anos
relegado a uma estante sem que ninguém o lesse, o folheasse, nem o comprasse
para que ele tivesse a atenção merecida. Mas ele está de volta e será relido,
como bem merece... espero que ele me perdoe.
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