Quando publicou Cabeça de papel em 1977, o jornalista
Paulo Francis tinha a pretensão que fosse o primeiro volume de uma trilogia que
esmiuçasse a elite intelectual brasileira nos anos imediatamente antes e depois
do golpe militar de 64, uma espécie de acerto de contas do autor com seu
passado, quando os intelectuais da sua geração acreditavam poder mudar o país. Como
admitira em 1994, tinha perdido “muito tempo com a política” e queria expor
suas ideias (sempre carregadas de polêmicas) através desses três romances.
“(Ingmar) Bergman está inventando que a classe média pensa, sente, que
é gente. Só se for na Suécia, mas lá não tem negro, mulato, mestiço, índio,
mineiro, nordestino, paulista (...). Aqui não dá pé”.
Hugo Mann (personagem-narrador e alter
ego de Francis) é um crítico de cinema desiludido, descrente da esquerda
partidária. Paulo Hesse é o ex-esquerdista que foi “cooptado pelo sistema”,
como se dizia na época. Há quem diga que esses dois personagens lutavam dentro
das incertezas do próprio Francis. Com uma narrativa meio confusa e anárquica,
Hugo e Paulo vão expondo seus pontos de vista sobre cinema, politica e
comportamento, um por convicção e o outro por conveniência.
“O mau gosto é filho inabortável e incorrigível da riqueza nova”.
Paulo Francis “Carregou nas
tintas” de tal forma que os editores tiveram que cortar parte do texto para que
ele ficasse menos intelectual. Não resolveu muito! O livro se equilibra mal
entre os debates de ideias, jorradas da boca dos personagens como uma
metralhadora, e a sequência narrativa. Resultado: o encadeamento entre as cenas
é frágil e, muitas vezes, confuso. Confuso também são os monólogos do
personagem-narrador que pouco servem à narrativa.
Um
casamento que resiste, ou qualquer relação constante entre pessoas, precisa do
estímulo das crises falsas, que, falsas, são fáceis de resolver”.
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