“Não havia característica que Clarice Lispector mais quisesse perder do
que o local de nascimento”.
Clarice Lispector completaria
ontem 96 anos se não tivesse falecido um dia antes do seu 57º aniversário, em
09 de dezembro de 1977. Nada mais justo que o post de hoje seja dedicado a ela. Por isso, trouxemos hoje aquela
que é considerada a biografia mais completa de Clarice. Clarice: uma biografia, publicada em 2009, fruto de cinco anos de
pesquisa do historiador americano Benjamim Moser, não é apenas mais uma
biografia da escritora, mas um estudo completo sobre muitas particularidades da
sua origem judaica, do seu universo literário e sobre a sua vida privada. Na edição da Cosac Naify, que ilustra essa
página, a capa traz a imagem da escritora na máquina de escrever, de autoria de
Cláudia Andujar, e o título “Clarice,” é uma referência ao estilo de escrever da
autora, que adorava esse sinal gráfico.
“Tamanho era o fascínio da misteriosa figura de Clarice Lispector, e
tão pouco o que se sabia suas origens, que ainda durante a sua vida todo um
conjunto de lendas floresceu em torno dela”.
Chaya Pinkhasovna Lispector
nasceu em 10 de dezembro de 1920 numa família judia na pequena aldeia de
Chechelnyk, região da Podólia, então parte da República Popular da Ucrânia. Devido ao
antissemitismo resultante da Guerra Civil Russa, a família (e muitos milhares
de judeus) foge da região e, depois de vagar pela Europa se hospedando em albergues,
emigram para o Brasil em 1922. Foi durante essa fuga (a família estava de
passagem pela pequena aldeia de Chechelnyk) que nasceu a pequena Chaya. No
Brasil, desembarcam em Maceió e trataram de substituir seus nomes russos por
nomes parecidos em português: o pai, Pinkhas, passou a se chamar Pedro; Mania,
a mãe, Marieta; Leah, a irmã, Elisa, Chaya, virou Clarice. A outra irmã, Tania,
manteve seu nome eslavo. Três anos depois, a família se muda para o Recife, que
tinha uma população judaica mais coesa. Após dez anos morando na capital
pernambucana, a família se muda para o Rio de Janeiro.
“Uma pergunta de quando eu era pequena e que só agora me respondo: as
pedras são feitas ou nascem? Resposta: as pedras estão”. (Clarice Lispector)
Um fato, acontecido pouco antes
da fuga, marcará profundamente a vida de Clarice. Sua mãe, Mania, foi estuprada
por soldados e contraiu sífilis. Uma tradição local dizia que a gravidez podia
curar a doença e a pequena Chaya foi concebida com esse propósito. Mas Mania
não ficou curada após o nascimento da criança e morreria em 1930, aos 42 anos.
Clarice viveu toda a sua vida com o sentimento de frustração por não ter curado
a mãe com o seu nascimento. Mas o livro não se atém apenas às particularidades
da vida autora, mas faz uma contextualização histórica de cada período da vida
de Clarice, desde os progroms, que
forçaram a família a fugir da Ucrânia, passando pela Era Vargas, quando havia
no Brasil um forte sentimento antissemita, e chegando à ditadura Militar,
quando a escritora fez forte oposição aos governos militares.
“Mas há perguntas que ninguém me responderá: quem fez o mundo? E o
mundo se fez? Mas se fez aonde? Qual era o lugar? E se foi Deus – quem fez
Deus?” (Clarice Lispector)
Confesso que nunca li Clarice
Lispector, tenha essa “mancha” no currículo. O livro de Benjamim Moser
despertou a curiosidade de ler alguns deles, mas me trouxe também a convicção
de não ler outros. Independente disso, é um livro fantástico não apenas por
falar da vida privada de uma das maiores escritoras da literatura brasileira,
mas fazer uma contextualização fantástica de quase sessenta anos de história e,
principalmente, por trazer a crítica de cada um dos seus livros, sejam
romances, contos, crônicas, novelas ou literatura infantil.
“Acima dos homens, nada mais há”. (Clarice Lispector)
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