O deputado Laerte Bessa (PR-DF),
relator da PEC 171/93, que trata da antecipação da responsabilidade criminal
para 16 anos, afirmou em entrevista ao jornal britânico The Guardian em 29 de junho: “Um dia, chegaremos a um estágio em
que será possível determinar se um bebê, ainda no útero, tem tendências à
criminalidade, e se sim, a mãe não terá permissão para dar à luz”. Essa teoria
é antiga, data do século XIX, quando o psiquiatra italiano Cesare Lombroso,
criador da antropologia criminal, afirmava ser possível afirmar se um sujeito
seria um criminoso a partir de suas características físicas.
Antiga e perigosa! Os nazistas se
apoiaram nas teorias de Lombroso para eliminar os filhos de seus desafetos,
afirmando que os filhos herdaram os “defeitos” dos pais. Mas a infeliz afirmação
do deputado nos leva à três reflexões. A primeira delas é com relação ao
aborto. Se a mulher engravida e não deseja ter o filho, os puritanos de plantão
se apressam em evocar a Bíblia para afirmar que isso “não é de deus” e que a
pecadora assará no fogo do inferno por ter “tirado a vida” do inocente. Quando
esse inocente é considerado um criminoso em potencial baseado numa “teoria”
ultrapassada e racista, ele deixa de ser “uma vida” e a mulher não tem escolha
a não ser fazer o aborto. Em outras palavras, o aborto deve ser uma
conveniência “deles”, não da mulher que é a legítima dona do seu próprio corpo.
Se até hoje os religiosos de plantão
preferem encarar o aborto como um caso de polícia e não o problema de saúde
pública, com a teoria obscena do deputado evangélico o aborto passará a ser
encarado como um caso “cientificamente” de Estado, de interesse de toda a
sociedade. O aborto pode ser encarado de todas as formas, de acordo com os
puritanos, menos como um problema de saúde pública ou uma decisão da mulher.
A segunda reflexão é com a relação à
capacidade de punir que esse povo que vive vomitando deus e relinchando orações
tem (o deputado faz parte da bancada evangélica). Se um feto, que é apenas
suspeito de se tornar um criminoso no futuro tem que morrer, o que não deve
acontecer com o criminoso já nascido? Ser brutalmente torturado por ter ousado
nascer e, pior, ter se tornado criminoso numa sociedade de justos? Me impressiona
a predisposição ao perdão dos cristãos.
A terceira reflexão na verdade é tão
somente uma pergunta: e se, no útero, for constatado que o feto tem tendências
a ser político? E, o que é pior, um deputado evangélico? Aborta?
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