
Continuo a andar. Vejo a distância o mendigo que a anos ocupa o mesmo espaço de calçada. As marcas no rosto denunciam uma vida sofrida. Mas também, muito possivelmente, uma vida de extravagâncias etílicas e sexuais. Os pés sujos atraem uma nuvem de moscas, que não o incomodam. Talvez o estômago vazio seja um incômodo maior. Observa-me com olhos tristes de retrospectiva. O que terá vivido? De quantas farras descomunais não terá tomado parte em seus anos de juventude? Quantas amantes possuiu? Quantas mulheres não fez chorar? Por quantas mulheres não chorou? Quando me aproximo, pronuncia a frase que a anos usa para pedir dinheiro aos transeuntes. Deposito em sua mão uma moeda e ouço o agradecimento de sempre. Que Deus lhe pague. Deixa para lá, mais uma dívida não paga, penso eu a sorrir.
Continuo a minha caminhada. As irregularidades das calçadas dificultam o passeio. Mas isso não me impede de observar um jovem casal. Ele é magro, parece ser daqueles homens que nasceram para viver em família, que todo prazer da vida resume-se em trabalhar para criar os filhos. È aquele tipo de homem que todos admiram, mas ninguém inveja, pois leva uma vida pouco interessante, sem sobressaltos. Ela carrega consigo uma beleza de outrora, estragada, possivelmente, pela gravidez. As amigas costumam lhe parabenizar pelo belo casamento, mas nenhuma delas gostaria de estar no seu lugar. Nasceram um para o outro. O carro deve ser financiado em 60 parcelas fixas, a casa será quitada em prestações nos próximos 20 anos, aos sábados à noite assistem filmes no DVD comprado no carnê, aos domingos passeios na praça com os filhos e pizza antes de assistir o Fantástico. Serão felizes para sempre.
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