O novo thriller do apresentador, escritor, músico, entre outras coisas Jô Soares é ambientado em 1938, durante o Estado Novo. O curioso do livro é que, ao contrário da tradição dos livros policiais, o assassino é revelado já no primeiro capítulo. No entanto, isso em nada tira a magia do livro. Caronte, o assassino, escolhe suas vítimas pela silhueta, ou seja, as gordas. O serial killer é um aficionado pela imagem da própria mãe, que era gorda e odiada por ele, e pelos pratos da culinária portuguesa que ela cozinhava. Com o assassino já conhecido, qual a graça do thriller? Morrer de rir com as trapalhadas dos investigadores da polícia carioca que investigam os crimes.
Mas isso não quer dizer que não haja um mistério: o que as gordinhas vítimas de Caronte fazem num determinado endereço no Beco dos Barbeiros. Além desse mistério, o livro também tem de interessante a mistura de personagens fictícios e reais. Os personagens são muito bem definidos, como o detetive Mello Noronha, responsável pelo caso das esganadas e os impagáveis Tobias Esteves, ex detetive português que vai ajudar no caso, e o Calixto, ajudante de Melo Noronha, que tem a malandragem nas veias, mas é medroso por vocação. A esses personagens, Jô acrescenta personagens reais, como Fernando Pessoa, Filinto Miller e Getúlio Vargas.
Uma faceta constante na obra literária de Jô e que ele sabe fazer com maestria é a escolha de um momento do passado como cenário da sua narrativa, permitindo-lhe entrar em detalhes históricos enquanto desenvolve a trama. Isso aconteceu em O xangô de Baker Street e O homem que matou Getúlio Vargas. Em As esganadas o cenário é o Rio de Janeiro da Era Vargas em pleno namorico com o Nazismo. Jô resgata uma corrida de automóveis no Circuito da Gávea, na qual participaram o cineasta Manoel de Oliveira e o lendário corredor Chico Landi. Outro resgate histórico é a narração pela rádio da derrota do Brasil de Leônidas da Silva para a Itália na semifinal da Copa de 1938. Última nota que torna o livro interessante: Jô realiza a façanha de narrar uma série de crimes brutais e, ainda assim, deixar o leitor bolando de rir.
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